17/05/2021 - 16:10
É possível estar protegido contra o novo coronavírus, devido a um resfriado anterior? Que percentual da população produziu anticorpos contra a doença? A ciência continua buscando respostas sobre a imunidade, o que pode ser essencial para evitar uma segunda onda pandêmica.
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“O fato de os casos de COVID-19 não terem aumentado após o relaxamento do confinamento em muitos países é intrigante”, admite o dr. François Balloux, da University College, de Londres, no Twitter.
Uma das explicações possíveis é que “um percentual da população possui imunidade preexistente ao SARS-CoV-2”, aponta.
Isso pode se dar, devido à “exposição passada a outros coronavírus responsáveis por resfriados banais”. E “poderia explicar alguns fenômenos surpreendentes, como os casos de casais que não se infectam entre si”, acrescenta Balloux.
Uma hipótese que Yonathan Freund, médico do serviço de emergência do hospital parisiense de Pitié-Salpêtrière, também considera, após observar uma diminuição significativa no número de infecções entre o pessoal médico desde o início da epidemia.
“É pura especulação, mas pode ser porque as pessoas têm imunidade natural, ou adquirida”, disse ele à AFP.
– “Imunidade cruzada” –
Essa ideia já foi evocada pelos cientistas para tentar entender por que a maioria das crianças não é vítima da COVID-19: os mais novos podem estar mais protegidos, porque são mais frequentemente infectados com outros vírus responsáveis por resfriados.
Esse conceito de “imunidade cruzada” ganhou força em meados de maio com a publicação de um estudo americano na revista “Cell”.
Entre 40% e 60% da população poderia estar imunizada contra a COVID-19 mesmo sem ter sido exposta a ela, graças à ação das células protetoras, os linfócitos T, previamente ativados por outros coronavírus causadores de resfriados.
Segundo seus autores, isso não significa, porém, que a pandemia esteja chegando ao fim.
“Nosso estudo sugere que uma imunidade preexistente pode ser um dos fatores, mas, no momento, é apenas uma hipótese, e são necessários mais trabalhos”, disseram à AFP seus dois autores, Alessandro Sette e Shane Crotty, do La Jolla Institute for Immunology, na Califórnia.
Uma prudência compartilhada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
“Não há evidências de que uma infecção anterior por outro coronavírus impeça a infecção por COVID-19”, estima Michael Ryan, um dos responsáveis.
Seja por meio da imunidade cruzada, ou não, cada vez mais cientistas acreditam em que nem todos são suscetíveis a ficar doente de COVID-19.
“Não se pode presumir que todos os indivíduos sejam igualmente suscetíveis, ou expostos, da mesma maneira”, disse à AFP a dra. Gabriela Gomes, pesquisadora da Escola de Medicina Tropical de Liverpool.
“Sabemos pouco dos fatores que determinam essas variações individuais. Pode ser imunidade cruzada, mas também fatores genéticos, idade, estilo de vida e, provavelmente, uma combinação de muitos elementos”, continua.
Isso também explicaria por que as primeiras estimativas indicam que a COVID-19 infectou uma pequena porcentagem da população em vários países (entre 5% e 10%) e implicaria, ao mesmo tempo, que o limiar de imunidade coletiva – ou seja, a porcentagem de pessoas imunizadas necessárias para acabar com a epidemia – é menor do que o esperado.
Até agora, acredita-se que esse dado seja de 60% a 70% da população.
– Vírus de inverno? –
Mas, para a dra. Gomes, essa estimativa vem de modelos matemáticos que estimam que todos podem contrair o novo coronavírus.
Em vez disso, a especialista acredita que a imunidade coletiva pode ser alcançada com entre 10% e 20% da população, segundo um estudo do qual é coautora e que ainda não foi avaliado por outros cientistas.
Para ela, pode haver “um aumento de casos semelhante a uma segunda onda nos países menos afetados até agora”, mas “os mais atingidos já estão próximos da imunidade do grupo”, e o vírus pode se limitar a brotar por “pequenos focos em regiões menos afetadas”.
Permanece, contudo, a questão de saber se o SARS-CoV-2 está sujeito às estações do ano e se uma segunda onda pode ocorrer no outono-inverno no hemisfério norte.
Apesar dessas incertezas, a ciência está avançando para entender o mecanismo de imunidade contra a COVID-19.
Um estudo do Instituto Pasteur, na França, mostrou que mesmo pacientes leves desenvolvem anticorpos que podem imunizá-los.
O objetivo agora é “estudar como essa resposta evoluirá: os anticorpos manterão a atividade neutralizadora? Por quanto tempo?”, disse à AFP o chefe da Unidade de Vírus e Imunidade do Instituto Pasteur, dr. Olivier Schwartz.