Equipes de emergência e voluntários seguem em busca, nesta sexta-feira (15), entre lama e escombros, de milhares de pessoas desaparecidas em Derna, cidade na costa leste da Líbia que foi destruída por uma inundação que atingiu a cidade como um tsunami e deixou pelo menos 3.800 mortos.

A tromba d’água da madrugada de domingo para segunda-feira provocou o rompimento de duas barragens e gerou uma enchente comparável a um maremoto de vários metros, que destruiu prédios, veículos e arrastou milhares de pessoas em sua trajetória.

Vários países e organizações internacionais ofereceram ajuda para a Líbia enfrentar o que um funcionário da ONU chamou de “calamidade de proporções épicas”, em um país assolado por anos de conflito e que conta com dois governos rivais.

“Ainda há esperança de encontrar sobreviventes”, afirmou Tamer Ramadan, diretor das operações da Federação Internacional de Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho na Líbia.

Ramadan se negou, no entanto, a anunciar um balanço de mortos, que “não seria nem definitivo, nem preciso”, em uma entrevista coletiva em Genebra.

Socorristas do Crescente Vermelho na Líbia “continuam buscando possíveis sobreviventes e retirando corpos dos escombros nos bairros mais atingidos”, explicou à AFP Taufik Chokri, porta-voz da organização.

O subsecretário do Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) das Nações Unidas, Martin Griffiths, advertiu que ainda não é possível compreender a dimensão da tragédia.

“Não conhecemos o alcance do problema, o nível das necessidades, o número de mortos ainda é desconhecido”, afirmou.

O Ministério do Interior do governo que controla a região leste da Líbia – que não é o governo reconhecido pela ONU – anunciou na quarta-feira um balanço de 3.800 mortos.

Porém, os números divergem neste país rico em petróleo e que ainda tenta se recuperar da guerra e do caos posteriores ao levante que derrubou o ditador Muamar Kadhafi em 2011, que resultou em duas administrações: uma na capital Trípoli, reconhecida internacionalmente, e um governo rival com sede na região leste.

A Organização Internacional para as Migrações (OIM) afirmou que mais de 38.640 pessoas estão deslocadas nas áreas mais afetadas, incluindo 30.000 apenas em Derna.

– ‘Arrastados pela água’ –

Um fotógrafo da AFP afirmou que o centro de Derna parece um terreno esmagado por um rolo compressor, com árvores arrancadas e edifícios e pontes destruídos.

Os moradores da cidade, que tinha 100.000 habitantes, relataram que centenas de corpos estão sob toneladas de lama e escombros arrastados pela água.

“A água estava carregada de lama, de árvores e pedaços de ferro. A enchente percorreu quilômetros antes de ocupar o centro da cidade e arrastar ou destruir tudo que encontrava pela frente”, disse Abdelaziz Busmya, um homem de 29 anos que morava em um bairro que não foi afetado pela inundação.

“Perdi amigos e pessoas próximas. Estão sepultados debaixo da lama ou foram arrastados pela água até o mar”, conta.

Ele disse que as autoridades líbias não adotaram as medidas de prevenção necessárias e se contentaram em ordenar que as pessoas permanecessem em casa antes da chegada da tempestade Daniel, que provocou estragos em sua passagem pela Turquia, Bulgária e Grécia.

O marechal Khalifa Hafter, homem forte do leste do país, se dirigiu para Derna para “supervisionar as operações de resgate”, informaram emissoras de televisão vinculadas a Hafter.

– Amostras de DNA –

Dezenas de corpos são encontrados a cada dia, alguns enterrados em valas comuns. Outros continuam presos em casas ou foram arrastados para o mar e depois devolvidos pelas ondas, afirmaram as autoridades do Departamento de Saúde, que temem possíveis epidemias ligadas à decomposição de cadáveres.

As autoridades enfrentam um dilema: conservar os corpos encontrados para possibilitar a identificação ou enterrá-los rapidamente para evitar a decomposição, já que a capacidade dos necrotérios é limitada.

“Estamos tentando […] obter amostras de DNA e fotos das vítimas antes de enterrá-las para ajudar na identificação mais tarde”, afirmou o tenente Tarek al Kharraz, porta-voz do Ministério do Interior do governo não reconhecido no leste do país.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) distribuiu 6.000 sacos mortuários na cidade.

O Programa Mundial de Alimentos anunciou que começou a fornecer ajuda alimentar a mais de 5.000 famílias deslocadas pelas inundações e afirmou que milhares de pessoas em Derna estavam “sem comida ou abrigo”.

E o Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU iniciou uma campanha urgente para arrecadar mais de 71 milhões de dólares (R$ 345 milhões na cotação atual) para ajudar as 250.000 pessoas sob maior risco entre as 884.000 que foram afetadas.

Estados Unidos, União Europeia e vários países do Oriente Médio e norte da África prometeram enviar ajuda. Equipes estrangeiras já estão na região.

bur/ila/hme/oaa/dbh-an/eb/meb/fp-rpr/mvv