As gêmeas americanas Isabella e Gabriella, com tons de pele diferente, são o fenômeno mais recente de celebridade precoce na internet. Com apenas sete meses de vida, as duas têm suas poses e descobertas publicadas no Instagram, onde possuem conta e rede social por meio da qual acabam vistas por milhões de pessoas. Filha do jogador Anderson Talisca, Maria Laura, de um ano, acabou de estrear na mesma rede e conta com quase dez mil seguidores. Sucesso que só aumenta, Titi Gagliaso, quatro anos, deve alcançar ainda este ano a marca de 200 mil pessoas que acompanham seus passos. Cristianinho, filho do craque Cristiano Ronaldo, tem sete anos e várias contas no Instagram. Somente na mais recente, tem 500 mil seguidores. Quase da mesma idade, Rafaella Justus, oito anos, é outra famosa. A filha de Roberto Justus e Ticiane Pinheiro é seguida por 221 mil internautas. Com doze anos, Yvi, filha do jogador Romário, virou youtuber e conta com mais de cinco mil inscritos em seu canal, onde apresenta um programa no qual fala de sua rotina, o Mundo da Yvi.

Crianças celebridades nas redes sociais é um fenômeno contemporâneo que desperta reflexões. Neste caso, a respeito dos limites da exposição dos pequenos, sua capacidade de reação diante de agressões virtuais, em que medida a vida online pode ser benéfica ou prejudicial e o papel dos pais nisso tudo. Os questionamentos fazem todo sentido, uma vez que o movimento cresce exponencialmente. Há as crianças famosas fazendo sucesso na rede – e já são incluídas na lista dos tais influenciadores digitais -, mas contas como o Instagram e o Facebook estão repletas de outros meninos e meninas anônimos cujas vidas são contadas em detalhes para o mundo assistir.

Os indicativos são de que essa infância compartilhada, somada a um status instantâneo de celebridade às crianças, pode fazer mais mal do que bem. “Expor as crianças desde cedo traz mais riscos do que oportunidades”, afirma a psicóloga Maria Tereza Maldonado, autora de “Cá entre nós: Na Intimidade das Famílias”. “ Como você vai ensiná-las a criar proteção nas redes sociais?”, questiona.

AGRESSÕES VIRTUAIS

Este é um dos pontos mais importantes na discussão. A audiência pode achar linda a nova roupa do bebê, o que massageia o ego do pais, mas pode também atacar os pequenos com a mesma intensidade que usa para agredir adultos no universo online. Os haters não poupam ninguém. É de se esperar que uma pessoa madura possua recursos emocionais para lidar com o problema, mas o que dizer de uma criança de nove, dez anos, que se vê bombardeada por críticas grosseiras?

Os pais podem reagir, claro, como fez o casal Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso para defender a filha Titi de ataques racistas. Eles descobriram os autores, os denunciaram à Polícia e a menina deixou de ser alvo de preconceito. Ao ser criticado por postar uma foto em que pratica esporte radical com o filho, Cristiano Ronaldo teve uma amostra do quanto os internautas estão ligados à vida de quem aparece em páginas virtuais. Foi taxado de “irresponsável” e passou a ser mais cuidadoso com Cristianinho. Clementina Shiple, mãe das bebês gêmeas, defende a exposição das filhas sob o argumento de que deseja mostrar a beleza da raça negra. “Os maravilhosos genes negros são capazes de criarem bebês únicos”, diz.

O fato é que a vida relatada no universo online exige maturidade de quem tem sua rotina registrada em tempo real e, no caso das crianças, dos responsáveis por isso. Outro problema, além das agressões, é o risco de a celebridade online de hoje acabar, no futuro, usando as redes mais do que seria saudável. Aos poucos, a ciência descobre o impacto sobre a mente de passar horas espionando a vida dos outros pela janela virtual. Uma pesquisa da Sociedade Real para Saúde Pública, da Grã-Bretanha, constatou que o Instagram é a rede que impacta de maneira mais negativa a saúde mental dos jovens, após avaliar o grau de ansiedade, de depressão e de solidão dos entrevistados. Em resposta, o Instagram disse que cuida para que a plataforma seja “segura e solidária”.

“Expor as crianças desde cedo traz mais riscos do que oportunidades”
Maria Tereza Maldonado, psicóloga