A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados deve votar nesta quarta-feira, 27, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) contra o aborto, que pode acabar com todas as possibilidades previstas no Brasil para a interrupção da gestação de forma legal. Hoje, o procedimento pode ser feito em caso de risco de morte à gestante, no caso de gravidez decorrida de um estupro ou caso o feto seja com anencefalia (má formação do cérebro).

O texto foi protocolado em 2012, é de autoria do deputado federal cassado Eduardo Cunha (Republicanos-RJ) e garante a inviolabilidade do direito à vida “desde a concepção”. “A vida não se inicia com o nascimento e sim com a concepção”, justificou Cunha à época.

Texto publicado por nove organizações sociais contra a PEC argumenta que a proposição pode ir além – proibindo, inclusive, a impedir a fertilização in vitro já que, no momento da implantação no útero após a fertilização, pode haver perda de embriões (em 2023, 110 mil embriões foram descartados nesse procedimento).

Entre outros argumentos, esse manifesto diz que a PEC acaba com as possibilidades de aborto legal, viola o direito de planejamento familiar, pode proibir pesquisas em embriões não implantados, impede o acesso a diagnósticos de pré-natal, impede acesso a técnicas de reprodução assistida, fortalece desigualdades raciais, viola direitos fundamentais.

O texto é assinado das organizações Nem Presa Nem Morta, Rede de Desenvolvimento Humano (redeh), Coletivo Feminista, Rede Nacional Feminista de Saúde, CFEmea, Comitê de América Latina e o Caribe para a Defensa dos Dereitos das Mulheres (Cladem), Católicas pelo Direito de Decidir, Grupo Curumim e Criança Não é Mãe.

Oposicionistas chamam a iniciativa de “PEC da Vida”, enquanto governistas dizem que é a “PEC do Estuprador”, já que mulheres não poderiam mais realizar a interrupção da gestação mesmo após terem sido estupradas.

“É de uma profunda crueldade. Porque nós temos três provisões de interrupção legal na gravidez, uma delas diz respeito às mulheres vítima de violência”, disse a deputada Erika Kokay (PT-DF).

Relatora da PEC, Chris Tonietto (PL-RJ) rebateu as críticas em uma sessão da CCJ há duas semanas. “Existe um ódio à criança. Eles estão querendo aniquilar o futuro da nação e os nascimentos”, argumentou Tonietto, uma das principais ativistas antiaborto do Congresso Nacional, nesta quarta.

A presidente da CCJ, a bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC) defende a PEC e intensifica a agenda conservadora no colegiado faltando poucas semanas para o fim do seu mandato no comando da comissão.

O aborto já tinha entrado na pauta do Legislativo federal neste ano, quando bolsonaristas promoveram um projeto de lei que equiparava o aborto feito após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, estabelecendo penas de seis a 20 anos de prisão para a mulher que realizasse tal procedimento.

A Câmara acelerou a tramitação desse projeto de lei no plenário em uma votação que durou cinco segundos. Após fortes críticas de movimentos populares e de organizações da sociedade civil, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu, em junho, criar uma comissão representativa para discutir o projeto e afirmou que essa proposição ficaria para o segundo semestre do ano. Até então, essa comissão não teve nenhum avanço.