A boemia está dividida. Enquanto algumas casas anunciam seus retornos, seguindo as limitações de horário e capacidade impostas pelo governo, outras preferem manter as portas fechadas como cautela, até que os números de contaminação da covid-19 cheguem a níveis mais seguros ou, no melhor dos cenários, a população comece a ser vacinada.

O Bar do Alemão, um dos endereços mais procurados pelos amantes do samba de velha- guarda, casa comandada por anos por Eduardo Gudin e que já recebeu em suas mesas Adoniran Barbosa, Paulinho da Viola, Paullo Vanzolini e Paulo Cesar Pinheiro, não pretende retomar as rodas nem reabrir as portas vistas fechadas há sete meses por quem passa pela Avenida Antártica. Durante todo o tempo de quarentena, ela sobreviveu graças à raça da atual responsável Livia Mannini e seus cozinheiros Guilherme Oliveira e Heleno da Silva.

Juntos, eles mantiveram as caldeiras em fogo alto para compensar a falta de atividades noturnas com a entrega de almoço, mas sofreram com as “sumidas” inexplicáveis da casa do aplicativo iFood. Sem entender por que seu endereço não aparecia nas buscas, tentaram informações mas não conseguiram. Investiram, então, em um serviço de entrega própria e, agora, vão reabrir o salão apenas para o almoço, um serviço feito para apenas três mesas, das 11h às 16h, de terça a sexta, com capacidade reduzida. “É isso, ou não chegaremos até novembro”, diz Lívia. O delivery segue, de terça a domingo, a partir das 11h. “Ainda não é o momento de retomarmos as atividades noturnas”, diz. “Nosso bar é pequenininho e o samba não permite isolamento social.”

Os bares Filial e Genésio, dois dos endereços mais clássicos da noite, dos tempos da boemia humanizada de São Paulo, também seguem sem prazo para retornar, apesar de tecnicamente poderem fazer isso. Na verdade, Helton Altman, um dos proprietários, negocia neste momento a venda das duas casas para uma poderosa marca de bebidas alcoólicas. Aos que o conhecem, sua possível saída da noite leva um dos maiores anfitriões de bares que São Paulo já teve, amante de música brasileira, conhecedor dos artistas e incansável agregador de pessoas. “A coisa que mais fiz nesses anos todos foi apresentar pessoas a outras pessoas.” As novas condições permitidas para a reabertura, diz Helton, não são para seus bares. “Como fecharia às 22h? Meu público não chega cedo.”

Ele diz que não vê uma nova boemia surgindo em substituição à sua geração. “Como criar uma boemia nesses dias? Impossível se tocar, é preciso manter o distanciamento, fechar a casa às 22h.” Dependendo da negociação com os possíveis novos proprietários, Helton poderia se manter envolvido com a programação musical, o que boa parte da classe artística torce para acontecer. De fato, as rodas que ele conseguiu atrair de forma espontânea desde 2018 são as melhores que um endereço que nunca cobrou ingresso para entrar poderiam ter: o baixista Arismar do Espírito Santo, a cantora Karine Telles, o bandolinista Fábio Peron, o pianista Salomão Soares, o violonista Paulo Bellinati, a cantora Patricia Bastos, o cantor Renato Braz. Um lugar que a cidade não vai produzir nem uma década.

De outras proporções, o Blue Note anuncia sua retomada. Luis Calainho, um dos sócios do clube de jazz mais novo da capital, aberto em 2018, anuncia sua programação. “Estamos totalmente preparados para a reabertura no dia 5 de novembro”, diz Calainho. Ele conta que a volta, feita mesmo que em meio a um momento tão difícil, fez com que a casa tivesse “a maior prioridade na segurança do público”. “Estamos adotando todas as medidas para proteger nossos espectadores, além de oferecer música de altíssima qualidade.” Ele afirma que vai trabalhar com 60% de sua capacidade e adotar o modelo “figital”, que permite assistir aos shows ao vivo, presencialmente e digitalmente. A área externa, ele conta, também foi repaginada.

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Cuidados

Chegar mais cedo

O novo comportamento das plateias requer mais rituais.

Assim, para que tudo dê certo antes do início dos shows, que passa a ser por volta das 20h, chegue ao lugar com meia hora de antecedência.

Máscaras

Elas são obrigatórias para chegar às casas e às mesas. Podem ser retiradas quando se estiver acomodado, mas recolocadas nas idas ao banheiro.

Ficar de pé

Vai do bom senso, mas alguns sambas, como o Porto Madalena, na Vila Madalena, estão proibindo as pessoas de ficarem de pé.

Distanciamento

O ideal é que as mesas mantenham-se afastadas em dois metros umas das outras.


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