19/03/2021 - 9:30
O toque de recolher está tirando os cassinos clandestinos das sombras. Não que estivessem completamente escondidos. Eles funcionam na nossa cara, em endereços conhecidos de médias e grandes cidades, mas, em condições normais, com discrição e sem serem perturbados pela polícia. Agora, por conta do aumento do rigor sanitário e das regras de isolamento, as aglomerações de pessoas que frequentam esses locais começaram a chamar a atenção de agentes de segurança e das autoridades de saúde. Só em São Paulo, três cassinos foram fechados em três dias seguidos, todos em bairros nobres. O último a tombar, no Jardim Paulista, ocupava o palacete de estilo veneziano que abriga a sede do Automóvel Clube Paulista, na esquina da Avenida Brasil com a Avenida 9 de Julho, e há anos opera nesse local, completamente escancarado. Nos últimos três meses, pelo menos outros dez bingos clandestinos foram desmantelados pela polícia em todo o País. O último caso foi na cidade de Americana, no interior de São Paulo, terça-feira, 16. Havia cerca de 30 pessoas, a maioria idosa, tentando a sorte no local e cometendo crimes contra a saúde pública.
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A jogatina está rolando solta nestes tempos de pandemia e só a ação policial pode interromper esse mal, já que os frequentadores negligenciam os riscos do coronavírus e desprezam regras básicas de isolamento. Os estabelecimentos descobertos são bem estruturados e acolhem um público de alta renda. O primeiro deles, localizado na Vila Nova Conceição, foi interditado domingo, 14. Havia cerca de 200 pessoas no local, entre elas o atacante Gabigol, do Flamengo, encontrado pela polícia escondido debaixo de uma mesa, e o cantor MC Gui, símbolo do funk ostentação brasileiro. O cacife para participar das rodas de pôquer era de R$ 40 mil. O jogo funcionava num ambiente suntuoso, que, segundo informações levantadas pela polícia, consumiu mais de R$ 8 milhões em investimentos. Na madrugada de segunda-feira, outro cassino, do mesmo dono, foi interditado no Itaim Bibi, por desrespeito à lei estadual que veta festas e aglomerações durante a pandemia. Todos os funcionários do lugar eram paraguaios e 25 pessoas foram detidas. Na segunda-feira 15, foi a vez da polícia invadir o lugar de apostas que funcionava no Automóvel Clube. Regra geral, tanto funcionários como os jogadores que estavam nesses lugares não usavam máscaras e nem se preocupavam com o distanciamento. Tampouco se encontrou dinheiro vivo no local. As apostas são normalmente feitas com cartões ou pelo PIX.
Ação policial
“Nós já estávamos monitorando a atividade ilegal e com a entrada na Fase Vermelha da quarentena, a aglomeração denunciou que no local havia algo estranho”, conta o delegado Fernando Cezar de Souza, do 78º DP, que comandou a operação em que 100 pessoas foram detidas. “É um prédio emblemático da cidade e antes da invasão colocamos dois policiais infiltrados para confirmar a contravenção”. A polícia identificou o responsável pela casa, o empresário Nagib Fayad, que esteve envolvido no escândalo da “Máfia do Apito”, esquema de manipulação de resultados no futebol brasileiro denunciado em 2005.
Apesar do barulho em torno do encerramento dos cassinos, o principal crime cometido pelos promotores de apostas está associado à saúde pública. Não foi o jogo que motivou a polícia a invadir os locais, mas sim as aglomerações. Se o promotor ou o participante de jogo ilegal for flagrado, ele será enquadrado no artigo 50 da Lei de Contravenções Penais, com penas brandas como trabalho comunitário e distribuição de cestas básicas. Considera-se o jogo um crime de menor potencial ofensivo. Já o problema de saúde pública está previsto no artigo 268 do Código Penal, que trata de infração de medida sanitária preventiva e pode resultar em detenção de até seis meses. Enquanto milhares de brasileiros morrem e as aglomerações estão proibidas, um grupo de irresponsáveis, inclusive personalidades públicas, ainda insiste em tentar a sorte em jogos ilegais. É uma verdadeira demonstração de idiotice.