Luiza Baldan – Estofo/ Anita Schwartz Galeria de Arte, RJ/ até 28/4

Luiza Baldan, 37, é uma artista de imersões em projetos de longa duração. Para a realização de “Estofo”, série que compõe sua individual na Anita Schwartz Galeria, no Rio, ela navegou pela Baía da Guanabara durante nove meses a bordo de um barco que monitora lixo flutuante. “Duas vezes por semana, o mesmo roteiro”, escreve a artista em texto que integra a exposição, exibido ao lado de uma carta náutica dos terminais da baía. “A luz muda, o lixo muda e a paisagem recorrente ganha novas nuances”. De fato, tudo isso está descrito na superfície prateada das fotogravuras em preto-e-branco de Baldan. Mas ao navegar munida de câmera e de caderneta de anotações, a artista manifesta a paixão do documentarista e revive o modelo das expedições artísticas, ou científicas.

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Ao torpor diante dos depósitos ilegais de metais pesados na Ilha de Pombeba corresponderia a ameaça ao navegante incauto do século XVI, ao atracar em sítios clandestinos de traficantes de armas e pólvora, nos fundos da baía. “Embarquei pela primeira vez na Baía de Guanabara 456 anos depois que o então governador geral do Brasil, Mem de Sá, expulsou dali os franceses”, anota a artista.

Assim como as correntes das marés se chocam durante as tempestades, o presente e o passado da baía se encontram no clique fotográfico de Luiza Baldan. Mas estofo, título do projeto, em linguagem náutica significa intervalo de tempo onde não há corrente de maré. O estado de suspensão — do tempo ou do movimento — é, portanto, a tônica dominante das imagens, realizadas com câmeras digitais, celular e técnicas fotográficas antigas: câmera analógica ou pinhole.

Baldan pertence a uma geração de artistas que encontra sua identidade no deslocamento. Já realizou projetos não apenas em zonas diversas do Rio de Janeiro, como em outras cidades e países, muitas vezes em residências artísticas. Oferecidas em instituições de arte de todo o mundo, as residências hoje são uma realidade quase mais habitual que o sedentarismo da vida dentro de ateliês. 27

As viagens para a série “Estofo” começaram há dois anos. Mas os vínculos com a paisagem remontam há mais tempo: em 2011, a artista fez uma festa de aniversário no Hotel Farol, na ilha de Paquetá. No ano passado, publicou em parceria com Jonal Arrabal o livro “Derivadores” (Automática Edições). Este é o nome dado às boias oceânicas rastreáveis. Para o projeto, elas foram adaptadas pela dupla de artistas para funcionar como câmeras pinhole.

Roteiros
Diálogos atemporais

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Candida Höfer – Diálogos com o Acervo/ Pinacoteca do Estado de São Paulo/ até 22/5

Três fotografias em grande dimensão da artista alemã Candida Höfer estão instaladas lado a lado com a pintura acadêmica de Almeida Junior, Eliseu Visconti, Henrique Bernardelli; com artistas da Missão Francesa como Jean-Baptiste Debret, Taunay e Ferrez; e com paisagens executadas no Brasil por artistas viajantes entre 1820 e 1890. A mostra integra o projeto “Diálogos com o Acervo”, uma bela iniciativa para ativar a exposição de longa duração da coleção de arte do século 19 do museu, “Arte no Brasil — Uma história na Pinacoteca de São Paulo”.

As fotografias pertencem à série “Räume (Spaces)”, que documenta espaços públicos relevantes e suntuosos, como museus, bibliotecas e salas de concertos. O recorte da Pinacoteca traz registros da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, do Real Gabinete Português de Leitura, no Rio, e da Ópera Bastille, de Paris. “Os espaços internos de edifícios históricos são registrados pela artista com um certo distanciamento”, diz da curadora chefe Valeria Piccoli. “Vai ser um contraponto interessante para o visitante, que pode se dar conta que, naquele momento, ele mesmo se encontra em um espaço que também tem um história institucional relevante”.

O programa é, sem dúvida, uma forma inteligente de instigar o interesse do visitante a voltar a visitar o acervo e aprofundar sua observação e conhecimento sobre a arte no Brasil. Já foram mostradas seleções de obras da coleção do Museu Mariano Procópio (MG), do Museu Paulista da USP, do artista contemporâneo francês Francis Alÿs e do brasileiro Rodrigo Andrade. Höfer fica em exibição até 22 de maio, mas a exposição da coleção do século 19 fica até o final de 2019. Até lá, receberá ainda muitos visitantes ilustres. PA