A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta quarta-feira, 25, que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve voltar a combater desinformação e veiculação de mentiras nas eleições de 2026, nos mesmos termos que o fez nos dois pleitos anteriores, de 2022 e 2024. Ela disse ainda que o Poder Judiciário tem trabalhado pela regulação das redes, e defendeu a responsabilização de plataformas em caso de descumprimento inconstitucional da “função social da propriedade”.
“O ministro Alexandre presidiu as eleições de 2022 enfrentando isso (desinformação), e eu presidi as eleições de 2024 de novo, e a cada etapa com mais e maior dificuldades. Tenho certeza que nas eleições de 2026, o próximo ano, isso acontecerá, e o enfrentamento haverá de ser mantido nos mesmos termos, com os mesmos princípios, para garantirmos a liberdade das cidadãs e dos cidadãos”, disse a ministra, atual presidente do TSE.
Cármen Lúcia participou, por teleconferência, do evento Global Fact, dedicado a debater verificação de fatos e combate à desinformação, sediado pela FGV Comunicação, no Rio de Janeiro, com o apoio das iniciativas jornalísticas Estadão Verifica, Aos Fatos, Lupa e UOL Confere.
A ministra reforçou que o volume de dados falsos é cada vez maior e mais veloz atualmente, impedindo que cidadãos tomem decisões com liberdade e autonomia.
“A desinformação, a mentira, a descontextualização, a criação de dados falsos hoje é oferecida num volume enorme de dados”, disse Cármen Lúcia. “Imagine isto num país que tem 5.569 municípios. Por exemplo, um eleitorado como o de São Paulo, a maior cidade da América Latina. O que chega de, “propaganda” em períodos eleitorais e pré-eleitorais é de tal monta que a pessoa durante todo dia recebe dados, observações, que ela não é mais capaz de fazer essa distinção entre o que vale e o que não vale, o que deve ser provável ou não, o que ela precisa de apurar ou não, e chega de toda forma, de toda natureza e de todo jeito.”
Segundo ela, a desinformação é propagada através de um “laboratório de mentiras, que são divulgadas, expostas, permitidas e repetidas numa dimensão nunca antes vista na história da humanidade”.
O atual método, diz a ministra, criou um “servilismo digital”, em que as pessoas desconhecem não terem sido livres ao tomar determinadas atitudes e opções, uma vez que as escolhas foram baseadas em dados falsos.
Trabalho insistente
A ministra afirmou que o Poder Judiciário e o Poder Judiciário Eleitoral têm trabalhado “insistentemente” pela regulação de plataformas, para que tenham a mesma responsabilidade que os demais setores econômicos, no cumprimento da lei sobre o dever social de propriedade. Cármen citou como exemplo as normas existentes para os fabricantes de automóveis e os revendedores de automóveis, mas também para usuários, os próprios condutores de automóveis.
“A terra na qual se planta drogas psicotrópicas é expropriada, é retirada pelo Estado brasileiro. Está expresso com todas as letras da Constituição brasileira. Não precisa, nem permite outra interpretação. Por que seria diferente com empresas que oferecem e plantam mentiras, que fazem florescer ditaduras, golpes, buscas de benefícios pessoais em detrimento do interesse público? Isto simplesmente não pode existir, porque é incompatível com o sistema constitucional brasileiro, com a garantia das liberdades que são responsabilidade de todos nós”, defendeu a ministra.
A magistrada afirmou que as plataformas contratadas para veiculação e impulsionamento de conteúdo não podem se eximir de responsabilidade “sobre o que é impulsionado, divulgado, mostrado, em detrimento das liberdades dos direitos fundamentais”.
“O Brasil não admite censura, porque a liberdade de expressão está garantida. E a minha geração que sofreu com a ditadura sabe bem o que é a mordaça. Isso não significa que alguém possa permitir que a expressão seja não uma manifestação da liberdade, mas que a expressão, como instrumento de um crime, que seja de injúria, de calúnia, de difamação, que seja crimes contra o Estado Democrático de Direito, que seja crimes contra a garantia do bem-estar dos menores, possa ser considerado um espaço de irresponsabilidade”, concluiu Cármen Lúcia.