O brasileiro Carlos Nobre – climatologista e membro do IPPC recompensado com o prêmio Nobel da Paz em 2007 – prega um novo modelo bio-econômico para a Amazônia que mantenha a “floresta de pé”, ideia compartilhada por muitos participantes do Sínodo em andamento no Vaticano.

Nobre, que contribuiu na elaboração de um relatório científico destinado a esta assembleia de bispos consagrada à região pan-amazônica (de 6 a 27 de outubro), explica à AFP que “a Amazônia tem um grande potencial econômico que pode beneficiar socialmente todas as populações indígenas e preservar suas tradições”.

“A ‘floresta de pé’ gera produtos com valor econômico para o presente e o futuro superior ao da destruição da floresta e sua substituição por terras agrícolas ou mineração”, insiste o brasileiro que estuda a Amazônia há 40 anos e que integra o IPPC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas).

“A ciência deve procurar soluções e não apenas falar de riscos. Devemos encontrar os caminhos para uma economia que mantenha a floresta de pé”, ressalta, ao considerar “as possibilidades incontáveis”.

Quarenta e dois cientistas internacionais prepararam para o Sínodo um balanço da situação com recomendações. Entre elas, dominar novas tecnologias e bio-indústrias de alto valor, por exemplo, nas áreas farmacêutica, de alimentos ou de cosméticos.

– Açaí e babaçu –

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A floresta é rica em açaí (com propriedades medicinais), palmeira de babaçu (óleo usado em cosméticos), castanhas e cacau.

Essas atividades podem ser enquadradas por rígidas normas ecológicas, ao mesmo tempo que protegem os direitos das populações locais, dizem os cientistas que lamentam que os países amazônicos tenham escolhido um modelo que envolva o uso intensivo das terras.

“Para que uma classe média surja na Amazônia, é preciso agregar valor aos produtos florestais, que possuem um valor intrínseco muito alto”, diz Carlos Nobre.

“Precisamos de uma revolução industrial e científica, para que a Amazônia e seu povo se apropriem desse valor e tenham uma melhor qualidade de vida!”, acrescenta.

A superabundância natural de água, calor e umidade faz com que os ecossistemas da Amazônia abriguem de 10% a 15% da biodiversidade terrestre.

Durante as duas primeiras semanas do Sínodo, bispos vindos principalmente da Amazônia, um punhado de representantes de povos indígenas e especialistas internacionais denunciaram o destino de populações por vezes ameaçadas de morte pelos predadores econômicos da floresta.

Entre eles, Felício de Araújo Pontes, procurador brasileiro especializado na defesa dos povos indígenas e que se opõe ao modelo econômico dominante no país (criação de gado e monocultura de soja).

“Do ponto de vista econômico, vale a pena manter essa floresta de pé”, diz ele, lamentando “uma mentalidade colonialista que persiste com a ideia de superioridade sobre o povo da floresta”.

– Constituição descumprida –

Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho (Rondônia), lembra que os povos indígenas foram prejudicados em seu país pela questão da distribuição de terras.

“A Constituição de 1988 previa que em 1993 todas as terras dos povos indígenas deveriam ser demarcadas, homologadas e registradas. Um terço delas foram [demarcadas], as demais foram invadidas por garimpeiros, indústrias de mineração e indústrias de petróleo e madeira”, reclama o bispo.


Desafiando as afirmações dos céticos climáticos, Carlos Nobre diz estar muito preocupado com a Amazônia, que se espalha por nove dos doze países da América do Sul, principalmente o Brasil.

“A ciência está mostrando que estamos muito perto de um ponto sem retorno”, ressalta, acrescentando que “60% a 70% da floresta amazônica podem desaparecer nos próximos 30 a 50 anos”.

“Devemos deter o desmatamento e alcançar desmatamento zero nos próximos anos, e devemos lutar contra o aquecimento global”, diz o climatologista.

Hoje, 15% da floresta já desapareceram devido ao desmatamento e, muitas vezes, a incêndios criminosos.


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