O vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos) tinha apenas 20 anos, em 2003, quando se dirigiu a um cartório no centro do Rio e pagou R$ 150 mil em dinheiro por um imóvel. O montante corresponde hoje a R$ 366 mil, corrigidos pelo IPCA. Investigado por supostamente se apropriar dos salários de funcionários “fantasmas” na Câmara Municipal, Carlos vai disputar o sexto mandato este ano.

O apartamento pago em “moeda corrente do País, contada e achada certa”, como diz a escritura que oficializou o negócio, fica na Rua Itacuruçá, na Tijuca, zona norte, e ainda pertence ao parlamentar. Na eleição de 2016, ele declarou que o imóvel valia R$ 205 mil. O documento de compra e venda foi obtido pelo Estadão no cartório em que o negócio foi fechado. Foi a primeira aquisição imobiliária de Carlos, lançado pelo pai, o hoje presidente Jair Bolsonaro, à política em 2000, antes de fazer 18 anos.

Procurado, o vereador não respondeu à reportagem.

Uma advogada ouvida pelo Estadão sob condição de anonimato disse que a expressão “moeda corrente, contada e achada certa” na escritura não deixa dúvidas de que o pagamento foi feito em espécie. Essa prática não é crime, mas costuma ser apontada como indício de suposta lavagem de recursos, já que não deixa rastro no sistema financeiro se não passar por um banco. Segundo a especialista, a aquisição do imóvel por essa forma de pagamento só desperta estranheza se a origem dos recursos não estiver evidente. A reportagem não conseguiu contato com o casal que vendeu o apartamento.

Carlos Bolsonaro é investigado por suspeita de nomear no seu gabinete funcionários que lhe repassariam, totalmente ou em parte, seus salários. Ao todo, 11 servidores estão sob investigação do Ministério Público. A maioria é ligada a Ana Cristina Siqueira Valle, que não é mãe de Carlos, mas foi casada com o pai do vereador.

Irmão de Carlos, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) também é investigado pelo Ministério Público do Rio por suposta prática de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no processo das “rachadinhas” (apropriação dos salários dos assessores) quando era deputado estadual. Este processo, em que constam nomes coincidentes com a apuração que mira Carlos, investigadores se debruçam sobre pagamentos em dinheiro vivo feitos pelo parlamentar.

O MP aponta indícios de que o senador fez pagamento “por fora”, em dinheiro, na aquisição de dois apartamentos em Copacabana, na zona sul. Nas escrituras, o valor declarado oficialmente era R$ 310 mil, mas no mesmo dia em que o negócio foi fechado, em novembro de 2012, o vendedor depositou em espécie, na própria conta, R$ 638 mil – e ele não havia feito nenhuma outra venda naquele semestre.

O MP suspeita de lavagem dos recursos oriundos de esquema de “rachadinha”. Flávio nega ter cometido irregularidades e diz ser alvo de perseguição política, cujo objetivo seria atingir o governo Bolsonaro.

Bens

A apuração sobre o vereador Carlos Bolsonaro ainda está no início. O imóvel na Tijuca é um dos três que compunham a declaração de bens apresentada por ele em 2016 à Justiça Eleitoral – a deste ano ainda não está disponível. Os outros são em Copacabana e no Centro, que valeriam, há quatro anos, R$ 85 mil e R$ 180 mil, respectivamente.

O imóvel de Copacabana, comprado em 2009 por R$ 70 mil, foi pago por transferência eletrônica, segundo a escritura. O pagamento do imóvel do Centro foi dividido entre um sinal de R$ 40 mil em formato não especificado, R$ 120 mil por meio de transferência no fechamento do negócio e R$ 20 mil em uma nota promissória.

Antes de adquirir seu primeiro apartamento, Carlos morava com a mãe, Rogéria Nantes Bolsonaro, em um imóvel em Vila Isabel, na zona norte do Rio. Rogéria, que tentará voltar à Câmara Municipal em novembro, depois de 20 anos fora da política, também comprou o imóvel pagando em dinheiro em espécie. O preço em 1996 foi R$ 95 mil, revelou o jornal O Globo. O Estadão confirmou a informação em cópia da escritura.

Ana Cristina Valle teve participação ainda mais ativa no mercado imobiliário enquanto foi casada com Bolsonaro, entre 1997 e 2008. Ela adquiriu 14 imóveis no período; cinco pagos em dinheiro vivo, segundo reportagem da revista Época publicada em julho. Em valores corrigidos, os pagamentos em espécie somam R$ 680 mil. Ela não foi localizada pela reportagem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.