Carla Ribas é o que se chama de atriz de processo. Adora um set de filmagem, o período de preparação de uma peça. Por isso, admite – “Vivem me chamando para fazer novela, mas eu declino. Tenho tido sorte de os convites baterem com compromissos já assumidos e, assim, nunca sou indelicada. Mas acho que não seria boa na TV. Ia queimar meu filme. Todos aqueles textos, na lata… Eu gosto é da preparação.” Carla Ribas é uma exceção no panorama atual. Uma atriz de teatro e cinema, com ocasionais passagens pela TV (paga), em projetos autorais. Agora mesmo, estará numa série baseada em Bruna Surfistinha. “Me disseram que deve estrear em junho, mas parece que iam mudar o título. De qualquer maneira, é a Bruna. Faço uma dona de bordel muito interessante. Me puseram um cabelão. Amei fazer.”

Ela estará nos cinemas a partir desta quinta, 2, com o novo filme de Sandra Kogut, Campo Grande. E, em breve, como a amiga e advogada de Clara/Sonia Braga em Aquarius, o longa de Kleber Mendonça Filho que o júri de Cannes, presidido por George Miller, criminosamente ignorou. Carla chegou a Campo Grande pela via de Fátima Toledo. A mais conhecida e polêmica preparadora de elenco do cinema brasileiro é fã de Carla – e a recíproca é verdadeira. Fátima, chamada para preparar o elenco de Campo Grande, jogava suas fichas em Carla. “A Sandra não estava 100% convencida, mas, quando ela escolheu o elenco infantil, minha interação com eles foi tão grande que suas resistências caíram. Foi uma parceria muito bonita.” E Carla prossegue. “No início, me assustei um pouco. Sandra queria que eu engordasse, que a personagem fosse largada. Fui sincera – estava louca para fazer o filme, aliás, faço sempre uma coisa de cada vez porque só faço o que gosto, e me dedico. Mas lhe disse que já tenho uma certa idade, que tenho de cuidar do colesterol, essas coisas, e que então lhe dava quatro quilos, não mais. Durante o processo, a gente não percebe, mas, quando vi o filme, tem uma cena em que apareço com pouca roupa. Meu Deus, estou um bagulho! E era isso que ela queria para compor a personagem.”

O que mais a impressionou no set de Sandra Kogut foi a concentração. “É um set silencioso. Quando não estava na cena, eu me sentava num cantinho e ficava só observando.” Foi o contrário da filmagem de Aquarius. “Havia ficado impactada com O Som ao Redor e topei de cara o convite do Kleber. Ia fazer a amiga que a Clara encontra no Rio, mas a personagem caiu, com a parte carioca. Kleber me colocou nessa outra personagem, que é bem forte (a amiga advogada). Estou louca para ver o filme.” Quando percebe que o repórter já viu Aquarius (em Cannes), a situação inverte-se. Carla pergunta sobre tudo – o filme, ela, Sonia. “Acho que para todos nós foi uma experiência e tanto trabalhar com a Sonia. Essa mulher é um mito do cinema brasileiro. Sonia diz que não é atriz, mas tem uma coisa, a luz da estrela, que a câmera imprime.”

Foi um prazer participar de Aquarius. “O Kleber é especial. Agrega. O filme tinha um monte de amigos dele, até diretores, que estavam no set em outras funções. Todo mundo ligado no astral do Aquarius, querendo fazer, com entrega.” E tem mais – “Ao contrário do set da Sandra (Kogut), que é aquele silêncio, o dele é bem ruidoso. Nunca tive antes a experiência de um diretor que fala com a gente, detrás da câmera, durante a cena. No início me preocupava, achando que o som ia vazar, mas depois me acostumei. São diferentes maneiras de trabalhar com os atores para chegar ao mesmo resultado. Como a Sandra, Kleber sabe o que quer. E ama os atores”.

Para ilustrar o método de Sandra, Carla conta que, numa cena-chave – você vai identificar quando vir Campo Grande -, ela pediu para abraçar o garoto Ygor Manoel no final. A diretora disse que não, mas Carla insistiu. “Vamos fazer do seu jeito e, depois, do meu.” O dela é o que chama de “momento lágrima”. Carla emocionou-se ao ver que Sandra usou no filme o abraço. “Foi muito generoso da parte dela.” A pergunta que não quer calar: em Cannes, Carla teria participado do protesto da equipe de Aquarius, levantando cartaz para protestar contra o impeachment no Brasil? “Dei graças a Deus de não estar lá, embora muita gente tenha identificado a Emilie (Lesclaux, produtora) como eu. Não sou assim, mas, nesse caso, estou em cima do muro. Não concordo com o que está sendo feito, todo esse processo, mas não posso defender o PT. Meu filho é economista e a gente discute muito o horror que foi feito com o País.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.