O monólogo cômico Il Risveglio (1977), de Franca Rame & Dario Fo, na tradução de NEYDE VENEZIANOO Despertar, é a nova criação artística da diretora, com interpretação da atriz CARLA CANDIOTTO. Foi encenado e gravado no palco do Teatro Giostri e será transmitido nos dias 11, 12 e 13, 18, 19 e 20 de junho,  de sexta a domingo, às 20h, com ingressos gratuitos. A transmissão acontece pelo canal de Youtube da Veneziano Produções. De acordo com a diretora, O Despertar é o primeiro espetáculo de uma série criada especialmente para Franca Rame e que precisa sempre de boas atrizes que tenham tem po de comédia e um entendimento profundo da tragédia do cotidiano feminino que está por trás da comédia apresentada.

“Queremos que a nossa plateia se aproxime, cada vez mais, da obra deste casal considerado “os introdutores da cena teatral contemporânea na Itália.”  A diretora escolheu Carla Candiotto “para levar o texto às últimas consequências. Porque essa estética lhe é familiar. Porque Carla Candiotto, como Franca Rame, também tem o DNA dos commici dell’arte”.  Com cenário e figurino de FÁBIO NAMATAME, a obra chega dois anos depois de Francesco, montado com Paulo Goulart Filho. Anteriormente, Neyde dirigiu MisteroBuffo, com Domingos Montagner – ambos de Dario Fo. A encenadora já havia traduzido o texto e estava com os direitos de montagem da peça.

O Despertar é o segundo texto dos 25 monólogos para mulheres da antologia feminina, a famosa obra do casal Franca & Fo. Seu foco é a mulher trabalhadora, a operária italiana dos anos de 1970. Na versão da encenadora, essa operária se transforma em uma vendedora de loja de R$ 1,99 assediada pelo patrão comerciante, maltratada pelo marido desempregado, e ainda sustenta a casa. “Mudamos essa função de trabalhadora de fábrica para comerciária, a fim de nos aproximarmos mais do universo brasileiro. Pretendemos provocar indignação na plateia, pelo desprezo e indiferença com que os mais ricos tratam as pessoas mais simple s, que representam uma classe social fragilizada duplamente: pela condição de mãe-mulher e pela condição  menos favorecida.” Veneziano acredita no valor histórico e dramatúrgico destes 25 textos. “É imenso o valor humanístico e, ao mesmo tempo poético. Uma dramaturgia reveladora sobre a submissão sexual da mulher e sobre o papel feminino na história mundial. Queremos chegar com a mesma força e vigor com que Franca chegava às plateias italianas dos anos de 1970.”

Quase uma partitura

O espetáculo Pagliacci, de 2017, com Cia La Mínima, foi o mais recente trabalho de Carla Candiotto como atriz. Ela enxerga o atual como “um exercício divertido de interpretação”. “Fazer comédia online é um desafio, pois o ritmo do espetáculo depende da resposta da plateia e, no caso, não há público presente no virtual”. O fato de ter sido interpretado por grandes atrizes (Debora Bloch, Denise Stoklos e Marília Pêra) também motiva Candiotto. Ensaiando sozinha em casa, conta que o texto é quase uma partitura. “São diversas situações que se repetem no curto espaço de tempo em que a personagem tem um ‘ataque’ ao rever suas últimas atribuições antes de sair de casa para o trabalho.”

Sinopse

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A personagem acorda cedo, pega o metrô para o trabalho e, antes de sair, precisa deixar tudo em ordem e, principalmente, arrumar o nenê (seu filho) para deixá-lo na creche. “Só que para tudo tem horário. Deve chegar na porta da creche antes que feche o portão. Suas coisas já estão em ordem. Porém, as confusões na hora de sair começam por atrapalhar a partir do momento em que não encontra a chave. E a porta está trancada!” Trata-se de uma comédia nitidamente de situação, recheada de gags próprias para palhaços e situações absurdas vão se sobrepondo: a chave some, ela repassa tudo que fez na noite anterior, o nenê chora muito, não pode acordar o papai, o nenê faz cocô, e la precisa trocá-lo, não tem água na torneira, ela aproveita a água da sopinha, coloca queijo ralado no lugar do talco e, assim por diante, atinge um tempo cômico quase chapliniano. “O absurdo do real cresce com a crítica aos patrões, com a péssima qualidade do transporte público, com a briga de casal, com as horas passando, até chegarmos no verdadeiro non sense que, por mais absurdo que seja, faz muito sentido!”, comenta Neyde

Proposta de Encenação

 Em sua concepção de encenação, Neyde Venziano colocou o palhaço em seu ambiente natural, ou seja, onde tudo é de mentira: o nenê é claramente um boneco, as cadeiras, a pia, e tudo o que está no entorno forma uma casinha de palhaço. Minimalista e metafórica. Ou seja, esse espaço é habitado por alguém que não é normal. Pensa que é, mas não é. “E é exatamente nesse ponto que queremos chegar: quando o espectador se reconhece no ridículo da situação e passa a criticá-la ou a si mesmo, revendo seus conceitos.”

Autoridade

Autoridade sobre a obra do dramaturgo contemporâneo mais encenado no mundo, Neyde morou um ano em Milão, entre 2000 e 2001, quando se debruçou sobre a obra de Fo e Franca, pesquisando o acervo da companhia, vendo vídeos, assistindo aos espetáculos, ensaios e palestras. Nesse tempo na Itália, por conta de sua pesquisa de pós-doutorado, Neyde Veneziano – autora do único livro sobre Dario Fo publicado no Brasil – conviveu com quem considera “figuras mais emblemáticas de um tipo de teatro que não se esquece da plateia e das causas sociais”, inclusive frequentando sua casa. Assistia a espetáculos de teatro com Franca Rame e chegou a atuar como sua assistente durante um workshop ministrado por ela a seis atrizes americanas, que queriam aprender com a autora os procedimentos atorais para o texto O Estupro.

Sobre Franca Rame e Dario Fo

Franca & Fo eram comediantes. Franca Rame é uma figlia d’arte, nasceu numa famiglia d’arte descendente da commedia dell’arte. Feminista e ativista de esquerda, a dramaturga Franca Rame – com sua postura de vanguarda – desempenhou papel fundamental na obra de Dario Fo. O Nobel de Literatura de 1997 aprendeu com a mulher e com os narradores dos lagos de sua infância a construir narrativas que prendem o interesse do espectador. Narrativas leves, divertidas e sarcásticas. Narrativas interrompidas por gags, pelo imprevisível e pelo absurdo. E é assim que emerge a sátira. Uma crítica ao mundo difícil e às dificuldades pelas quais passam as mulheres de hoje.

Feminista e ativista de esquerda, a dramaturga Franca Rame foi vítima de um brutal estupro coletivo em 1973, que Fo atribuiu a militantes fascistas dispostos a humilhá-lo. No discurso de agradecimento ao Nobel, Fo dedicou o prêmio à mulher, dizendo que era dos dois e que sem ela não ganharia. Franca Rame esteve também na política. Foi eleita senadora em 2006, mas renunciou dois anos depois, por discordar das políticas do governo de centro-esquerda da época. O Despertar faz uma crítica ao patriarcado e, através da figura de uma mulher da classe trabalhadora, mostra a alienaç&atild e;o e as formas de opressão operadas.

Atualidade

A diretora observa que “ainda hoje nos deparamos com feminicídios e violências contra mulheres. Para o Brasil, principalmente e infelizmente, essa obra é ainda muito atual. Para compreendermos o contexto em que os textos para mulheres foram criados é necessário entender o panorama histórico e político da Itália naqueles anos sombrios”, observa Neyde.

Roteiro e Ficha técnica


O Despertar – Monólogo cômico Il Risveglio (1977), de Franca Rame & Dario Fo. Tradução, adaptação e direção de NEYDE VENEZIANO. Interpretação de CARLA CANDIOTTO.

Encenado e gravado no palco do Teatro Giostri.  Será transmitido nos dias 11, 12 e13, 18, 19 e 20 de junho,  às 20h, com ingressos gratuitos. De sexta a domingo. A transmissão será pelo canal da Veneziano Produções no YouTube.

Cenografia e Figurino – Fabio Namatame. Desenho de Luz e Operação – André Lemes. Captação de Imagens – Rodrigo Veneziano.  Transmissão on line – Lincoln Monteiro. Fotografia – Rodrigo Veneziano.


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