Candidatos à presidência da França disputam a herança de Charles de Gaulle

Candidatos à presidência da França disputam a herança de Charles de Gaulle

A cinco meses da eleição presidencial na França, os candidatos, da esquerda e direita, disputam a herança política do general Charles de Gaulle, especialmente no momento em que o polemista de extrema-direita Éric Zemmour, que também reivindica o legado, estremece uma campanha de final incerto.

Personalidade chave da libertação da ocupação nazista e presidente da França entre 1959 e 1969, De Gaulle continua sendo uma figura capital e, todo 9 de novembro, dia de sua morte, os políticos viajam a Colombey-les-Deux-Églises para homenagens.

“A memória de De Gaulle é recuperada com frequência no período pré-eleitoral, mas após dois anos de crise de saúde, econômica e social são ainda mais numerosos (…) os que desejam vincular suas propostas com a herança dele”, afirma o jornal Libération.

O 51º aniversário de sua morte nesta localidade, que fica 200 quilômetros ao sudeste de Paris, acontece em plena batalha cultural com os candidatos de esquerda e direita, assim como integrantes do governo, defendendo sua figura, com Zemmour no alvo.

“Quando você escuta pessoas que legitimam a atuação de Philippe Pétain (marechal colaboracionista) dizendo que ele salvou judeus, elas não podem ser chamadas de gaullistas”, disse Valérie Pécresse, que aspira liderar o partido Os Republicanos (LR, direita) na eleição presidencial.

A presidente da região de Île-de-France aponta de maneira velada para as controversas palavras de Eric Zemmour, um polemista que, apesar de ainda não ter confirmado sua candidatura à presidência, protagoniza a campanha. Algumas pesquisas apontam inclusive que ele chegará ao segundo turno.

“Pensando que eu iria anunciar a minha candidatura hoje, toda a classe política se disfarça de general De Gaulle (…) Sugiro que sorriam: é isso que o general teria feito”, tuitou o ultradireitista, que tem entre seus temas prediletos o islã e a imigração.

Zemmour tentou em 18 de junho estabelecer um paralelo entre sua vida e a do ex-chefe de Estado, ao homenagear “um escritor” que é “tudo menos um político profissional”, ansioso por “salvar” a França.

A líder da extrema-direita Marine Le Pen, que de acordo com as pesquisas está perdendo a vaga no segundo turno para Zemmour, que também teria o atual presidente, o liberal Emmanuel Macron, escolheu Bayeux (noroeste) para reivindicar a figura histórica.

“Escolhi, como ele, a coragem da ação e me reivindico seu legado político para ver renascer uma França soberana, independente e orgulhosa”, declarou Le Pen, na praça em que o general fez um discurso em junho de 1944 após o desembarque da Normandia.

Mas para Dominique Moisi, conselheiro do centro de pesquisas Institut Montaigne, De Gaulle era “unificador e pragmático, ético e realista”.

“O contrário daqueles na extrema-direita que ousam reivindicar seu legado”, escreveu no jornal Ouest-France.

“Somos fiéis. De Gaulle era um nacional, não um nacionalista”, disse o ex-negociador do Brexit para a União Europeia (UE), Michel Barnier, um dos cinco candidatos, junto com Pécresse, de direita para a eleição presidencial.

Na esquerda, duas personalidades, entre elas a candidata socialista ao Palácio do Eliseu, a prefeita de Paris Anne Hidalgo, também o transformaram este ano em um símbolo na luta contra a “apropriação” da história por Zemmour.

“Eu sou gaullista de 18 de junho”, afirmou Hidalgo, em referência ao discurso de 1940 em que o general convocou a resistência do povo francês. Ela também elogiou a “imensa coragem e visão” do general, que tomou “decisões impressionantes”.

De acordo com as pesquisas mais recentes, Emmanuel Macron, que ainda não anunciou oficialmente a candidatura, conseguiria a reeleição ao vencer no segundo turno Zemmour ou Le Pen, por menos de 15 pontos de vantagem.