A Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou nesta sexta-feira (24) um projeto de lei que garante o direito ao aborto, uma votação histórica, mas que acaba sendo apenas simbólica, já que as chances do texto avançar no Senado são escassas.

Controlada pelos democratas, a Câmara aprovou hoje a Lei de Proteção à Saúde da Mulher por 218 votos a favor e 211 contra.

Mesmo contando com o apoio do presidente Joe Biden, é pouco provável que o projeto avance no Senado, onde a exígua maioria democrata enfrentará a oposição dos republicanos.

Em uma decisão histórica de 1973, no caso Roe vs. Wade, a Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos garantiu o direito da mulher ao aborto desde que a sobrevivência do feto não seja viável fora do útero, o que geralmente não ocorre antes de 22 a 24 semanas de gravidez.

Contudo, muitos estados liderados por republicanos têm tentado restringir o acesso ao aborto, e a iniciativa da Câmara dos Representantes é uma tentativa dos democratas de tornar a decisão de 1973 uma legislação federal, impedindo qualquer restrição estatal ao procedimento.

Uma lei do Texas que entrou em vigor em 1º de setembro proíbe o aborto após seis semanas, antes que muitas mulheres saibam que estão gravidas, e não faz qualquer concessão para casos envolvendo estupro e incesto.

A chamada “Lei do batimento cardíaco do Texas” (“Texas Heartbeat Act”, em inglês) permite que qualquer pessoa processe os médicos que realizam abortos depois de seis semanas, e qualquer outra pessoa que contribua de alguma maneira para o procedimento.

Por sua vez, a Suprema Corte, que tem hoje um perfil mais conservador após a confirmação de três juízes indicados pelo ex-presidente Donald Trump, rejeitou bloquear a entrada em vigor da lei texana por um placar de 5 a 4 votos.

A legisladora democrata Diana DeGette, que representa o estado do Colorado, disse que o Congresso se viu obrigado a intervir para assegurar o direito da mulher a optar pelo aborto. Ela acrescentou que mais de 500 leis restringem o acesso ao aborto em estados de todo o país e que já não existem clínicas que realizam o procedimento em 90% dos condados americanos.

“É por isso que hoje, se os juízes do outro lado da rua [em referência ao edifício da Suprema Corte em Washington] não atuam para proteger esta liberdade de atendimento médico, a Câmara dos Representantes vai fazê-lo”, disse DeGette.

“Esperamos que o Senado, quando vir esta votação histórica na Câmara, atue em consequência”, acrescentou.

-‘Um salto histórico’-

A Suprema Corte analisará em 1º de dezembro o pedido de impugnação de uma lei do estado do Mississípi que proíbe quase todo tipo de aborto após a 15ª semana de gestação.

Em sua decisão sobre a lei do Texas, o supremo tribunal não ouviu argumentação oral, por isso o caso do Mississípi será o primeiro sobre aborto aberto à discussão diante dos magistrados desde que Trump deu uma maioria de 6 a 3 para os conservadores na corte.

Algumas associações que defendem o direito ao aborto deram boas-vindas à votação realizada hoje na Câmara.

“É um passo importante para garantir o direito de acesso ao aborto nos Estados Unidos e interromper a onda de restrições ao aborto em todo o país, que são prejudiciais e profundamente impopulares”, opinou Alexis McGill Johnson, presidente do grupo Planned Parenthood.

Georgeanne Usova, assessora legislativa da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU, na sigla em inglês), disse que a Câmara tinha “dado um salto histórico”.

“Por décadas, os políticos atacaram pouco a pouco o acesso ao aborto”, disse Usova em comunicado. “O Texas deixou claro qual era o objetivo final desses ataques: proibir o aborto e obrigar as pessoas a seguir com a gestação mesmo contra sua vontade”.