“De porta em porta” Luciano Huck
Ed. Objetiva
Preço: R$ 49,90 e R$ 29,90 (ebook) (Crédito:Divulgação)

Luciano Huck é conhecido do público desde 1997, mas só virou uma celebridade em 2000, quando assumiu as tardes de sábado na Globo, a maior emissora do País. O fato de ser casado com outra personalidade pública, a atriz e apresentadora Angélica, contribuiu para ampliar sua exposição midiática, com todas as implicações que isso traz. A mais imediata é que, para muitos, o fato de ser uma figura da TV o limita a um personagem cuja relevância só se dá na frente das câmeras. Huck, no entanto, nunca aceitou essa imposição. Transformou seu programa, o Caldeirão, em uma espécie de laboratório social do Brasil. Cruzou o País de norte a sul, ouviu relatos de brasileiros de todos os perfis e classes econômicas. Isso não é maneira de dizer: exposto a uma realidade que vai da bilionária Faria Lima aos rincões do Nordeste, compreende como poucos a urgência dos nossos problemas. Podia, confortavelmente, deixá-los do lado de fora de sua mansão, mas resolveu decifrá-los antes que o País onde ele e sua família vivem seja devorado. Saiu por aí — literal e metaforicamente, em videoconferências — para aprender o que pode e deve ser feito. Essas lições, entrelaçadas a histórias de sua vida pessoal, compõem o livro “De Porta em Porta”.

Ao abrir o livro, logo se vê por que, nos últimos tempos, o nome de Huck tem surgido nas altas rodas da política e do empresariado como uma opção para liderar o País. Inteligente e analítico, ele demonstra uma sensibilidade social que vai muito além da caridade pontual promovida em alguns quadros de seu programa. Seu livro é repleto de experiências vividas por ele e sua família, mas é o oposto do que estamos acostumados a ver em autobiografias de pessoas públicas. Há uma exposição bastante corajosa, que revela bem mais a fragilidade de seu narrador que uma invencibilidade típica dos populistas. O relato começa com um caso terrível: o acidente aéreo sofrido por sua família quando voavam em um bimotor sobre a região do Pantanal matogrossense – episódio só não levou a uma tragédia graças à destreza do piloto. Há outras memórias, como o acidente sofrido pelo filho Benício quando praticava o esporte arquático wakeboard em Ilha Grande, litoral carioca. Huck aproveita o tema para falar sobre espiritualidade e religião. Para abordar preconceito e tolerância, dá um belo depoimento sobre o meio-irmão, Fernando Grostein Andrade, a respeito de sua decisão de assumir a homossexualidade perante a família.

“Tenho clareza dos meus privilégios. Para buscar soluções, precisamos reconhecer nossas regalias. Só assim temos legitimidade para debater os caminhos e buscar um País mais eficiente e menos desigual”

O livro associa esses e outros casos a entrevistas realizadas por Huck ao longo da pandemia. Sua origem familiar, judaica, por exemplo, surge quando o assunto é ditadura e autoritarismo. Para trazer o tema para o contexto brasileiro, conversa com Anne Applebaum, autora do livro “O Crepúsculo da Democracia”. Debate também com Yuval Noah Harari, autor de “Sapiens” e “21 Lições para o Século 21”, e leva o filósofo para conhecer a realidade da comunidade Tavares Bastos, no Rio de Janeiro, onde o apresenta ao empreendedor social Douglas Pinheiro de Oliveira, fã de seus livros. A tecnologia entra em cena por meio dos diálogos com Peter Diamandis, geneticista formado pelo MIT e fundador da Singularity University. Quem fala sobre os rumos do capitalismo é o economista francês Thomas Piketty, autor de “O Capital no Século XXI”. O papel do Brasil no mundo é tema para Fareed Zakaria, professor de relações internacionais da Universidade de Harvard. Huck, que nem sequer é um político, faz tudo o que os políticos brasileiros deveriam estar fazendo: ouvindo especialistas, pesquisando soluções, aprendendo com exemplos ao redor do mundo.

O livro não é partidário, mas é impossível não ver uma concepção política em suas entrelinhas. Huck se apresenta como um debatedor pragmático de ideias e isento de ideologias, algo que o Brasil precisa com urgência. Apesar das pressões que sofreu para se candidatar em 2022, Huck optou por se dedicar ao novo “Domingão com Huck”, programa que ocupará o lugar de Faustão nas tardes de domingo na Globo. Até 2026, terá um longo caminho a percorrer, dia após dia, de porta em porta.