Uma troca pública de críticas entre o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e o senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro da Casa Civil de Jair Bolsonaro (PL), deflagrou um novo capítulo na sequência de cisões do campo de oposição ao governo Lula (PT).
Na manhã de domingo, 5, Caiado publicou no X (antigo Twitter) que Nogueira quer “decidir por Bolsonaro” quanto às eleições de 2026, está “ansioso” para ser candidato a vice-presidente de Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, e que sua própria pré-candidatura ao Palácio do Planalto, lançada em abril, “não depende do aval” do senador.
Sobre a entrevista do senador Ciro Nogueira hoje ao Globo, quero dizer o seguinte:
1)A ansiedade de Ciro Nogueira em se colocar como candidato a vice-presidente do governador Tarcísio é vergonhosa, e algo tão gritante que ele já se coloca como porta-voz do presidente Bolsonaro,…
— Ronaldo Caiado (@ronaldocaiado) October 5, 2025
Minutos depois, Nogueira foi à mesma rede social para dizer que “não tem tempo” para “polêmicas vazias” e que o adversário de ambos é o presidente Lula.
Vi a postagem do governador @ronaldocaiado sobre minha entrevista. Me chamou a atenção a enormidade do tamanho. Deve estar com o tempo livre. Eu não. Sobretudo para polêmicas vazias.
Nosso adversário é Lula. Caiado, pode falar qualquer coisa: você está certo. Satisfeito?— Ciro Nogueira (@ciro_nogueira) October 5, 2025
Mesmo barco, rumos diferentes
Em entrevista concedida ao jornal O Globo, o senador defendeu haver dois candidatos viáveis à Presidência da República com o apoio de Bolsonaro, condenado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) por uma tentativa de golpe de Estado e inelegível até 2030: Tarcísio e o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD).
O dirigente descartou, portanto, a tese de outras lideranças, como o próprio Caiado e o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), que mantêm suas pré-candidaturas e consideram que o grupo bolsonarista não precisa se unir até o segundo turno de 2026. Para o goiano, o projeto da oposição não deve sequer aguardar o aval do ex-presidente.
O choque de interpretações é um problema porque, hoje, Caiado e Nogueira são colegas de federação. PP e União Brasil se uniram em agosto e passaram a ostentar a maior bancada da Câmara dos Deputados, o que assegura as maiores fatias do fundo eleitoral e do tempo de propaganda eleitoral para seus candidatos na próxima eleição.

Tarcísio de Freitas: governador de São Paulo é objeto central das críticas de Caiado ao colega de federação
Com o acordo, as siglas são obrigadas a ter chapas conjuntas em eleições majoritárias (para prefeito, governador e presidente) nos próximos quatro anos. Assim, para concorrer ao Planalto pelo seu partido, Caiado terá de ter apoio do comando da federação, hoje reticente em aderir a este plano. Como contou a IstoÉ, legendas como o Solidariedade “abriram as portas” para abrigá-lo se uma mudança for necessária.
Além dessa indefinição, União Brasil e PP ainda encaram um dilema quanto ao desembarque do governo Lula. Após determinar que os ministros Celso Sabino (União, do Turismo) e André Fufuca (Esportes, do PP) deixassem seus cargos, a federação vê o movimento ficar em xeque com a melhoria na popularidade da gestão.
O racha na direita
Mais do que uma cisão partidária, a discussão entre Caiado e Nogueira agrava um contexto de divisão na direita, hoje polarizada entre o bolsonarismo puro e aqueles que estão dispostos a fazer concessões.
A principal liderança do grupo radical é o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que tem defendido ser ele mesmo candidato a presidente na ausência do pai. Ao seu lado, destacam-se o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) e o blogueiro Paulo Figueiredo Filho, que atua nos EUA junto do “03”.
Conforme revelou o jornal O Globo, Eduardo tem sido chamado de “maluco” por seu irmão, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), em conversas com lideranças do Congresso. Na família, o senador é mais afeito ao diálogo com forças políticas que não se restringem à direita radical. Ambos negaram a alcunha.
Nessa linha, em defesa da aproximação entre o bolsonarismo e o “centrão”, estão ainda o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o próprio Nogueira. O primeiro disse que Eduardo vai “ajudar matar o pai” se insistir na candidatura presidencial; o segundo pregou união da direita e disse que o grupo será “cabo eleitoral de Lula” se não resolver suas divergências a tempo das eleições de 2026.
Ambos consideram que a atuação de Eduardo nos EUA e a intransigência na defesa de bandeiras radicais impõem um “teto” de votos para a oposição e, para atrair legendas que ocupam ministérios no governo federal, como PSD e MDB, se movimentaram para emplacar Tarcísio como substituto de Bolsonaro nas urnas — movimento que ainda não teve sucesso.

Bolsonaro: cisões da direita refletem, ao final, a indefinição do ex-presidente quanto a 2026
Mesmo neste flanco, porém, a regra é evitar indisposição com o ex-presidente — sem sua força, as chances de eleger bancadas numerosas no Congresso se reduzem. “O candidato desse grupo em 2026 terá de apresentar um verniz de moderação capaz de atrair o centro e, ao mesmo tempo, um componente radicalizado, para assegurar o apoio de Bolsonaro”, afirmou Monalisa Torres, professora de ciência política da Uece (Universidade Estadual do Ceará), à IstoÉ.
Para Daniel Pinheiro, professor do departamento de administração pública da Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina), a manutenção da dualidade pode fazer com que os Bolsonaro estejam em lados distintos na próxima eleição. “Se a família se unir em torno de um discurso, há mais perspectiva de fortalecimento do chamado ‘bolsonarismo’; a ausência dessa articulação, como se viu em outros momentos, pode gerar fragilização”.