O ano vai chegando ao fim com radicais raivosos ameaçando funcionários da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) por causa da aprovação da vacinação para crianças de 5 a 11 anos com o imunizante da Pfizer/Biontech, algo que Jair Bolsonaro, considera inaceitável. É mais um capítulo da saga negacionista do governo. O que foi aprovado pelos próprios laboratórios, pela própria agência reguladora, pela maioria dos médicos é, na cabeça do presidente, uma violação de direitos, uma extrapolação sanitária.

Mesmo que os infectologistas considerem as crianças um importante vetor da doença, na medida em que convivem com outras pessoas e favorecem a contaminação. Embora raramente apresentem casos graves, elas ajudam na transmissão do vírus. Vários países do mundo já começaram a vaciná-las, como Estados Unidos, Alemanha, Grécia, Hungria, Espanha e Chile, sem detectar até agora qualquer efeito adverso. Mas por aqui o governo trata de criar empecilhos para proteger a população.

O que se viu nos últimos dias foi uma verdadeira caça às bruxas. Na sua fúria insensata, Bolsonaro ameaçou divulgar os nomes de todos os técnicos da Anvisa que deram o aval para a vacinação infantil, o que levou a uma sucessão de ameaças de agressões e até de morte feitas por seus apoiadores a profissionais que fazem uma avaliação técnica e honesta.

O presidente e seu ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, também cuidaram de acionar um grupo de 45 médicos antivacina, liderados pela perita Maria Emília Gadelha e pelo pediatra Edmilson Migowski, que divulgaram um documento de 30 páginas questionando a decisão da agência sobre a imunização das crianças. Esse grupo normalmente ampara as teses mentirosas do governo, como a defesa do uso da cloroquina e de outros remédios inúteis. No documento, contrariando as evidências científicas, eles alegam que a vacina ainda é um medicamento experimental que poderia causar “graves problemas” e “efeitos adversos” nos jovens.

Definitivamente não é o que a Anvisa diz. Como vem acontecendo desde o início da pandemia, Bolsonaro tenta melar o processo de imunização e tumultuar iniciativas que contribuam para o combate à doença. Apoiado no documento dos médicos negacionistas, Queiroga está propondo um debate amplo sobre o assunto antes de colocar a vacinação infantil em prática.

É mais uma tolice para confundir a população, um esforço protelatório para impedir que mais vidas sejam salvas. Para endossar essa posição abjeta, o ministro disse que “a pressa é inimiga da perfeição”. Mas, por outro lado, a demora na vacinação, inclusive para crianças, é amiga da morte.