E  frente às câmeras e aos microfones de jornalistas, a harmonia entre o PL é certa, mas quando as conversas chegam aos bastidores a única certeza é a de que o racha no partido se amplia a cada dia. E não se trata somente de uma divisão nas bancadas da legenda. Está em jogo uma série de estratégias montadas pelos dois grupos que dominam a sigla e tentam fazer valer suas posições. A ala mais radical composta, sobretudo, pelos bolsonaristas, se organizou para convencer os partidários que defendem a adesão à cooptação que o governo Lula vem fazendo aos seus parlamentares para que venham a apoiar o governo, enquanto que os governistas procuram convencer os mais extremistas a cederem aos seus argumentos de colaborarem com a governabilidade. Boa parte dos 99 deputados do PL de Valdemar da Costa Neto entendem que podem aderir ao governo, principalmente nas matérias econômicas, mas permanecendo fieis a Bolsonaro quando se tratar das pautas de costumes.

Bater na porta dos gabinetes, conversas privadas, convites para um café e jantares, tudo isso tem sido arquitetado pelo núcleo bolsonarista, que hoje é bem expressivo na sigla de Valdemar. Esses parlamentares querem se fortalecer no Congresso para formar uma base sólida com o objetivo de travar as propostas de Lula, preparando assim terreno às candidaturas da extrema direita à Presidência da República em 2026. A caça aos dissidentes do bolsonarismo raiz – ou infiéis, como classificam alguns correligionários – surgiu com o objetivo de destituir o atual líder da legenda na Câmara, Altineu Côrtes (PL-RJ), para emplacar pautas mais conflituosas e posicionamentos de ataques aos Poderes, sobretudo às decisões do STF (Supremo Tribunal Federal). No resumo, avaliam apoiadores de Côrtes, os radicais querem apenas “brigar” com o governo Lula.

Bolsonaristas do PL estão em uma caça aos deputados que desejam aderir ao governo
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Um grupo de WhatsApp foi montado com quase 50 membros do partido. À ISTOÉ, fontes afirmaram que nesse grupo são discutidas estratégias extremistas e os desapontamentos com os rumos de parlamentares da sigla que veem como possível manter relações com o governo Lula na troca de cargos e que os favoreçam politicamente nas suas bases. Vários deputados se revoltaram por não terem sido aceitos nesses debates e sentiram-se marginalizados das tratativas elaboradas pelos participantes. Isso aflorou os conflitos.

Outros correligionários tentam amenizar as intrigas e alegam que o grupo foi constituído para discutir os regimentos das duas casas legislativas. “É um grupo de estudo, nada mais que isso. Tudo o que tratamos na no grupo, fica lá”, enfatizou um dos integrantes. As discussões online resultaram em encontros particulares, onde se estaria organizando uma espécie de rebelião contra também o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, amigo pessoal e o maior aliado de Altineu Côrtes.

A liderança do grupo seria do deputado federal Marcos Pollon (PL-MS), que está ao lado de nomes como Nikolas Ferreira (PL-MG) e Bia Kicis (PL-DF). Eles estariam ventilando novos nomes para compor a representatividade do partido, a exemplo de Carlos Jordy (PL-RJ) como líder da oposição na Câmara, que não descarta fazer campanha para substituir Côrtes na liderança do PL na Câmara.

Um dos parlamentares ouvidos pela ISTOÉ sob condição de anonimato disse que a frente extremista passou a impor uma cultura iniciada no PSL, antiga legenda do ex-presidente Jair Bolsonaro, para desestabilizar a harmonia entre os correligionários e defender a bandeira da discordância permanente. “O Carlos Jordy sempre foi um dos cabeças. Eles faziam rachas no PSL e toda hora pegavam assinaturas para destituir alguém. Isso só nos enfraquece”, disse um parlamentar ligado a Côrtes.

Embora o clima esteja mais quente na Câmara, no Senado ainda se buscam os que acompanharam a base governista e não votaram em Rogério Marinho (PL-RN), mas sim em Rodrigo Pacheco (PSD-MG) à presidência da Casa. Houve pelo menos três possíveis dissidentes na votação, apontados como um risco à oposição. A primeira tentativa de descobrir as traições ocorreu justamente durante a eleição, quando o senador Eduardo Girão (Podemos-CE), aliado de Marinho, começou a discutir com o presidente em exercício, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), para que os votos de todos os senadores fossem abertos. Lá se construía a ideia de constranger e expor qualquer integrante do PL que demonstrasse apoio a Pacheco. Não houve êxito, mas a busca continua.

Na liderança do partido na Câmara, Altineu tem realizado reuniões fechadas com frequência. Sobre as divergências, ele evita inflamar os ânimos a adota um tom conciliador. “Como líder do PL, procuro sempre mostrar a toda bancada que o nosso fortalecimento será feito como união de todos, respeitando a pluralidade da nossa bancada. A gente sabe que tem deputados que são mais à direita e deputado mais ao centro. Cada um tem uma história e eu procuro mostrar a todos que o importante é que nós seremos fortes se nós formos unidos”, comentou.

Bolsonaristas do PL estão em uma caça aos deputados que desejam aderir ao governo
OPOSIÇÃO O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, diz que o partido não fará parte da base de apoio de Lula (Crédito:Adriano Machado)

Para diminuir a tensão e dar a famosa “bronca em quem precisa”, Valdemar da Costa Neto marcou uma reunião com integrantes do partido após o feriado de Carnaval. Ele planeja reforçar que o PL é um partido de oposição ao governo Lula e nunca será cogitado como sigla que venha a fazer parte da base do governo, mas que, eventualmente, é preciso pensar no acompanhamento de pautas que fortaleçam as bases do partido. “Acho uma boa ideia, mas consenso será difícil de ser atingido”, afirmou um parlamentar.