Heloisa Cruz, gestora do fundo Stoxos, é a convidada do novo episódio do MoneyPlay Podcast, programa voltado para o mundo das finanças, apresentado pelo educador financeiro Fabrício Duarte. 

Formada em Engenharia Química e analista certificada (CFA), Heloisa também trabalhou na Fator Corretora, nos bancos J.P.Morgan e Itaú, além da consultoria Guepardo. No programa, ela fala sobre a mudança de carreira após a descoberta do mercado financeiro, sua estratégia de investimento e o preconceito que sofreu por ser mulher em um mercado dominado por homens.

>>> Assista aqui o vídeo na íntegra.

Reza a lenda na família de Heloisa que a única gota de sangue judeu que veio de seu avô foi para ela. Ela se recorda que, desde pequena, já gostava de dinheiro. “Meu pai é médico e, quando voltava com os cheques das consultas, eu vibrava com eles.”

Talvez o amor pelo mercado financeiro também tenha vindo desde o seu nascimento. “Nasci no hospital onde meu pai trabalhava e a diversão na época era assistir a cesárea dos filhos dos colegas no final do dia”, conta. “Tinha uns 15 médicos e o assunto era Bolsa de Valores.”

O investimento inicial na bolsa veio apenas quando ela ganhou o primeiro bônus. Começou a estudar mais a fundo o mercado financeiro e se apaixonou. O trabalho de consultoria estratégica se tornou chato e remunerava menos do que os investimentos na bolsa. Não foi difícil trocar.

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Maternidade

Mas nem sempre foi fácil ser mulher em um mercado ainda bastante masculino. “Sofri preconceito. Ouvi, por exemplo, que eu era tão inteligente que às vezes a pessoa se esquecia que eu era mulher”, lembra. 

Quando estava pensando em ter filhos, ela foi questionada por que não congelava seus óvulos e deixava para aproveitar a carreira e ser mãe depois. “Foi horrível e eu nem sabia como lidar com isso.”

Heloisa entende que a maternidade de alguma maneira atrapalha o ambiente de trabalho. “Se você se ausentar, não dá para colocar uma pessoa no lugar. Uma analista de petróleo, por exemplo,  carrega dez anos de experiência no setor e o fundo vai ficar seis meses sem essa profissional”, justifica.

Mas acredita que a mulher que quer ir para o mercado financeiro não deve abrir mão da maternidade por causa da carreira. “Se eu tivesse que escolher, ficaria com a maternidade. É muito mais gratificante e interessante”, diz. 

A saída, acredita, é se estabelecer profissionalmente e financeiramente para estar mais confortável até mesmo se quiser parar. “Mas se não quiser parar, acho super válido, porque geralmente uma mulher que está no mercado financeiro acaba sendo mais focada na carreira”, acrescenta. “Só tente trabalhar em um lugar que não seja tão agressivo.” 

Gestora de fundos

Hoje, Heloisa consegue conciliar a criação dos três filhos com a gestão de um fundo de investimentos em renda variável de quase R$ 100 milhões. Segue a estratégia de apostar em grandes assimetrias. “Busco empresas que possam me dar 100%, 200%”, explica. 

Nessa linha, as small caps (ações de empresas de baixo valor de mercado) acabam se tornando as preferidas da gestora. “Elas  têm muito mais para ganhar do que para perder.”

Um exemplo de small cap presente na carteira do fundo de Heloisa é a Inepar. A empresa está em recuperação judicial – não tem nem operação, só ativos -, ou seja, apenas administra um portfólio de processos judiciais e os ativos que precisa vender para pagar dívidas e sair da recuperação judicial para voltar a operar. “Comprei a ação a R$ 6 há uns três anos. Havia um laudo de avaliação de R$ 70 e ela chegou a bater R$ 80, mas poderia chegar a zero.”

A posição principal da carteira de Heloisa atualmente é a Simpar, da JSL. Ela conseguiu montar uma posição grande a R$ 4, mas sabia que a ação valia pelo menos R$ 20. “Hoje, ela é negociada a R$ 60”, compara. 

“Com as small caps estou competindo com não profissionais. É muito mais fácil, pois pessoas físicas não têm tempo suficiente para estudar, não têm acesso à empresa, muitas vezes não conseguem entender ou não sabem fazer a conta certa ou olhar um pouquinho além daquele prejuízo do último trimestre”, compara. 

Heloisa trabalha praticamente sozinha. Tem dois analistas juniores que a ajudam a estruturar o trabalho, mas é ela quem faz a análise da carteira sozinha. “Como tenho três filhos pequenos, quero curtir a maternidade e não tenho condições de ter um escritório, um time, administrar pessoas, pois quero fazer do meu jeito.” 

Cuidados para investir

A engenheira química diz que sempre estuda as empresas para ter uma ideia de quanto valem e, assim, entender qual ação está sendo precificada muito abaixo do que vale e montar uma carteira diversificada.

Ela afirma ter muita gente falando contra taxas de administração, mas pessoas investindo em algo que não entendem e que não têm tempo para olhar. “Acho super legal médico ou advogado que gosta de investir, mas pra quem vai dedicar tempo.” 

Heloisa não gosta de pensar no ativo bolsa, porque acha o índice Bovespa (uma espécie de “termômetro” do mercado nacional de ações) muito ruim. Ele é formado por ações das principais empresas do mercado aberto de capitais.  

Ela explica que o índice é formado com 14% de ações da Vale, que acredita não ser um ativo que vá puxar a bolsa. Outra grande participação é da Petrobras, que hoje tem um cenário de guerra política. “Não é um ativo que eu tenha, apesar de achar super barato”, diz. 

Outro grande peso no índice são os bancos, que passam por uma mudança estrutural. “Há vários players ‘comendo’ um pedacinho desse negócio, de fintechs até  bancos digitais, além dos bancos que pegam um outro mercado de investimentos”, analisa. “Sobra para os grandes bancos dar crédito e eles são mais de 20% do índice. E tem todo um resto de varejo que são ações mais premium bem precificadas.”

Sobre IPOs (oferta inicial de ações na bolsa), Heloisa não é grande fã, mas não deixa de investir. “Não gosto, pois é uma empresa que você não tem histórico”, justifica. “Entretanto, tenho olhado muitos IPOs de empresas que vieram para bolsa com muito potencial – mais de 30% da minha carteira são empresas que foram listadas nos últimos 15 meses.”

E, mesmo com a bolsa instável atualmente, Heloisa não acredita que o cenário seja ruim. “Hoje, eu não vejo um problema estrutural que poderia trazer um impacto muito grande. A bolsa está caindo 20%, paciência, segue o jogo”, afirma. “Muitas coisas que são de longo prazo estão se travando, mas a gente vai colher os frutos daqui a três, quatro, cinco anos.”

Confira aqui todos os episódios do programa.