A creditem em mim. Tá faltando só um tiquinho pra o país do futuro virar de vez o país do presente. – insistia
vocês se lembram do Brasílio?

Brasílio é o último brasileiro que ainda acredita.

Acredita em tudo. No país, nos políticos, no brasileiro.

É um sujeito boa praça, sem partido, sem ideologia.

O mote que ele mesmo inventou em portuñol é “se hay govierno, concuerdo”.

Para Brasílio, não existe razão para ser oposição.

– Tem que apoiar, caceta. De que adianta meter o pau? A gente é que se ferra no fim.

Ao longo dos anos, sempre apoiou quem sentasse na primeira-cadeira.

– Acreditem em mim. Tá faltando só um tiquinho pra o país do futuro virar de vez o país do presente. – insistia, com o indicador a um milímetro do polegar.

E isso na era Collor.

Em sua imensa fé no país, cunhou frases históricas que hoje repousam enquadradas na parede do boteco onde todas as semanas se reúne com os amigos.

“FHC é tipo um tio-avô que da gente, vocês não acham?”

“Lula eu queria para sogro, caceta.”

“Essa Dilma é brilhante, vai na minha.”

Quando Bolsonaro levou a covarde facada na barriga, a turma do bar ficou preocupada.

– Vocês tão tudo louco. O homem é militar. Isso aí, pra ele é arranhão.

Em novembro Brasílio foi para Brasília para guardar lugar.

– Quero assistir a posse na primeira fila. Momento histórico.

Mas conforme foi chegando o dia, desistiu.

– Lá não vai dar para ver direito. Vou assistir pela Globo. Quem sabe eles botam o Bonner para narrar.

Então, na última terça-feira, Brasílio convocou toda a família para comer as sobras da ceia do Réveillon e, no sofá da sala, enrolado na bandeira do Brasil, exigiu silêncio absoluto.

Ao seu lado estava Ruth, sua mulher de 27 anos.

Não de idade. De casados.

Ruth regula com Brasílio, por volta de 55 anos, mas tem um problema.

É petista. Petista de raiz. Não dessas que discutem. Pior que isso. É dessas que provocam.

Assim, resolveu que, bem na hora do discurso, ia ficar fazendo seu tricozinho.

Um suéter vermelho com uma estrela branca no meio.

– Vou mandar para o presidente, lá em Curitiba – explicou para a filha, que é cirurgiã dentista.

Brasílio, sempre muito calmo, não se conteve:

– Pra que isso, gorda? Pra que me estragar esse momento tão importante?

– Importante pra você gordo. Pra mim esse fanfarrão não vale o pão que come.

Justo nessa hora, surgiram as primeiras cenas do casal Bolsonaro.

Michelle em seu tomara que caia cor-de-rosa e seu cabelo despojado roubavam a cena.

Nem Ruth conseguiu se conter:

– Tá bonitona ela. Pelo menos isso.

– Shhhhhhhh. – exigiu Brasílio.

A cerimônia começou.

Quando Bolsonaro deu a palavra para a mulher, Brasílio falou baixinho, com ele mesmo:

– Um gentleman, fala aí…

Michelle surpreendeu a todos e fez seu discurso em libras.

Ruth repousou o tricô no colo e assistiu mesmerizada.

A filha deu a mão para a mãe. Se olharam visivelmente sensibilizadas.

Veio Bolsonaro.

Brasílio não podia se conter.

Durante os 9 minutos da fala do presidente levantou três vezes, sempre com o ímpeto de um gol do Brasil.

Não dizia nada.

Apenas apontava para a tela com as mãos e olhava para todos em volta como quem diz “Tô falando! É isso! É isso!”.

Quando a cerimônia terminou, a família estava em silêncio, emocionada.

Já Brasílio estava em êxtase.

Pensou em dizer algumas palavras.

Mas antes de se manifestar, olhou para a mulher, esperando sua reação, porque para ele, família é tudo.

Ruth olhou para o marido e, singela, suspirou:

– Bom…tá tudo muito bem, tá tudo muito bom, mas deixa eu tocar aqui o suéter que o inverno de Curitiba vai ser bravo.