Estou escrevendo no fim da tarde desta segunda-feira, dia 28 de junho. Já se passaram praticamente três dias inteiros desde que o deputado Luis Miranda revelou à CPI da Pandemia que Jair Bolsonaro mencionou o líder do seu governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros, como possível responsável por maracutaias na compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde. Até agora, o presidente não abriu o bico para desmentir a afirmação.

O que quer dizer esse silêncio? Quer dizer que a probabilidade de Bolsonaro de fato ter apontado o dedo para Ricardo Barros é altíssima, próxima de 100%.

Se não houvesse dito nada, o presidente já estaria cuspindo cobras e lagartos por aí contra o deputado, como costuma fazer à mínima provocação. Pouco importaria Luis Miranda ter insinuado que tem um registro em áudio da conversa. O presidente pagaria para ver.

E o que significa o fato de Bolsonaro suspeitar do líder do seu governo, quando lhe relataram uma possível roubalheira, e mesmo assim não ter mexido um dedo?

Significa um possível crime de prevaricação – que ocorre quando um agente público deixa de cumprir seu dever funcional para satisfazer um interesse próprio. Na tarde de hoje, os senadores Randolfe Rodrigues, Fabiano Contarato e Jorge Kajuru já apresentaram ao STF um pedido de investigação contra o presidente.

Mas, independentemente das consequências legais, significa também o fim da conversa mole de Bolsonaro sobre “governo sem corrupção”, “fim do toma-lá-dá-cá” e outras fantasias.

Bolsonaro foi avisado da tramóia e não fez nada. Mais ainda, Bolsonaro já tinha um suspeito e não fez nada. Ele foi conivente. Achou melhor não atrapalhar nenhum esquema do líder do seu governo – para não atrapalhar seu próprio esquema de reeleição. Isso sim é retidão de caráter.

Entre os vários grandes momentos do clássico Casablanca (1942) está aquele em que o Capitão Renault (Claude Rains) anuncia que vai interditar o bar de Rick (Humphrey Bogart).

“Estou chocado! Chocado com esta jogatina acontecendo aqui!”, diz Renault.

Se você não assistiu o filme, a graça é que a cidade toda sabe que se joga no inferninho. Inclusive o capitão, que logo em seguida recebe um maço de notas do crupiê e manda todo mundo para casa.

O espectador não condena o Capitão Renault. Ele é um pilantra charmoso, que jamais finge ser honesto. Sabemos, além disso, que no fundo ele está do lado certo da História, pois não tolera os nazistas.

Bolsonaro é o contrário do Capitão Renault. Ele não é charmoso. Ele torce pelos autoritários. Ele pretende ser um santo entre pecadores. Ele, enfim, é só um pilantra.