O quebra-quebra em Brasília na noite de segunda-feira, no dia da diplomação de Lula, foi o canto do cisne dos movimentos golpistas inflados por Bolsonaro. Não prenunciam um movimento de massa contra o futuro governo. Ao contrário, mostram que os acampamentos bolsonaristas degeneraram em simples baderna.

O grupo político que prega a ordem acima de tudo (e tenta se mostrar próximo das polícias e das Forças Armadas) protagonizou cenas lamentáveis de ônibus incendiados, arruaça nas ruas, apedrejamento de carros de bombeiros e tentativa de invasão de sede da Polícia Federal.

Ao que consta, Bolsonaro inicialmente se animou silenciosamente no Alvorada, onde abriga o radical Oswaldo Eustáquio, candidato à prisão. Achou que podia ser o começo do golpe. Quanto percebeu o fiasco, começou a comentar que se tratava de uma ação de infiltrados de esquerda.

“Estamos vivendo um momento crucial, uma encruzilhada. Quem decide o meu futuro são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês. Quem decide para onde vai a Câmara e o Senado são vocês”, disse Bolsonaro no cercadinho do Alvorada para seus apoiadores recentemente, depois de um longo silêncio (e choro). Esse incentivo velado à rebelião era a última esperança que o mandatário tinha em virar o jogo. Não virou.

O resultado da eleição foi cristalino, e a presença massiva de autoridades na cerimônia do TSE, que teve aplauso de pé para o ministro Alexandre de Moraes, estampou o isolamento do chefe do Executivo. Ele está só no seu sonho golpista. Em 1964, a Marcha da Família com Deus pela Liberdade tentou demonstrar, com alguma aderência, que a sociedade estava do lado do putsch. Agora, o mandatário é apoiado somente por poucos generais de pijama, bandidos que bloqueiam rodovias a tiros e turbas que gostam de venerar pneus e cantar o hino nacional para muro de quartéis.

Como candidato a ditador moderno, Bolsonaro forjou seu movimento em mentiras. E seu entorno ainda tenta usar a técnica da desinformação. Seu ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, tentou pregar uma mentira após sentir o cheiro de queimado nos distúrbios de segunda à noite. Tentou associá-los à esquerda e a Lula, já que os baderneiros tinham jeito de “black blocks”. Segundo ele, não é coincidência que os incendiários tenham surgido exatamente na véspera da posse de Lula. A desculpa chega a ser patética.

Isso não significa que acabaram os riscos para a democracia. Quase metade da população acreditou em Bolsonaro, como as urnas mostraram, e será preciso muito trabalho para reconstruir a máquina pública e fortalecer as instituições. Lula precisará pacificar o País, governar para todos, inclusive bolsonaristas, e ampliar seu governo para abarcar o centro, que o apoiou no segundo turno. Pelo desenho inicial de seu ministério e pelas palavras ditas ao receber o diploma, ainda está longe desse objetivo.