NO MEIO AMBIENTE – Sonia Guajajara, Ministra de Estado dos Povos Indígenas

Aos 48 anos, mãe de três filhos, primeira deputada indígena eleita por São Paulo em 2022 pelo PSOL, ex-candidata a vice presidente, Sonia Bone de Souza Silva Santos, essa maranhense nascida na Terra Indígena Araribóia, berço da etnia Guajajara/Tentehar, chegou ao comando do Ministério dos Povos Indígenas como consequência natural de uma carreira construída com determinação.

Sonia Guajajara é uma síntese do indígena que consegue romper a cultura opressiva: foi empregada doméstica, babá, professora e enfermeira, até tornar-se ativista, experiência que abriria caminho às conferências internacionais, um tambor através do qual o mundo ouviu e entendeu que a defesa do meio ambiente e do modo de vida dos povos tradicionais é caminho seguro para enfrentar a crise climática que sacode a humanidade.

Filha de pais analfabetos, Sonia Guajajara nunca abandonou os estudos. Aos 15 anos, aproveitou uma bolsa da Funai para cursar o ensino médio em Minas Gerais, de onde ingressou em vários outros cursos até tornar-se pós-graduada em Educação Especial e bacharel em letras. Comandou várias entidades ligadas à causa indígena e meio ambiente, como a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), através das quais desenvolveu intensa atividade como militante de causas cujos resultados sempre soube que passariam pela política que a tornou a primeira ministra indígena.

Foi-se o tempo em que o índio era enrolado com miçangas e falsas promessas, ou vivia passivamente sob a proteção do governante de plantão.

Como em nenhum outro momento da história, os indígenas chegaram ao poder, viraram gestores das políticas públicas para seus territórios e assumiram o ônus e o bônus da conquista, uma mudança consolidada logo no início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a criação do Ministério dos Povos Indígenas.

A decisão é resultado da persistência de uma enfermeira maranhense que enxergou na política a ferramenta de transformação. “Não temos mais só uma política indigenista. Temos agora uma política indígena, com interlocução direta, sem aquela velha ideia de tutela dos não indígenas”.

A ministra Sonia Guajajara é o nome por trás da mudança que corrige uma dívida social que remonta aos tempos do Brasil colonial e que foi eleita pela revista ISTOÉ como a Brasileira do Ano no setor do Meio Ambiente.

A nova estratégia é ocupar todos os espaços na política, do legislativo ao executivo, e disputar pela via institucional, de igual pra igual com outros segmentos, a inclusão da pauta indígena como política de Estado.

A mudança começou a ser operada há oito anos quando Sonia Guajajara assumiu o comando da Articulação de Povos Indígenas do Brasil (APIB), a entidade que unificou reivindicações isoladas e abriu canal de negociação com a política, estimulando candidaturas indígenas em todas as unidades da federação.

Em 2018, ela mesmo caiu nas graças do PSOL e saiu candidata a vicepresidente na chapa encabeçada pelo deputado Guilherme Boulos, em cuja campanha marcou posição forte e participou do esforço que ajudou a eleger a primeira mulher indígena para uma vaga na Câmara dos Deputados. Joênia Wapixana (Rede-RR) cumpriu quatro anos de mandato, não se reelegeu, mas tornou-se em 2023 também o primeiro indígena a presidir a Funai, criada há 65 anos e ocupada ao longo da existência por militares, políticos e até um delegado que, no trágico governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, desmontou a autarquia, escancarando territórios indígenas à sanha de madeireiros e garimpeiros.

“Não temos mais só uma política indigenista. Temos agora uma política indígena, com interlocução direta, sem aquela velha ideia de tutela dos não indígenas”

A guinada comandada por Guajajara colocou os índios em outro patamar. São cinco deputados federais – quatro progressistas e um, ideologicamente fora da curva, alinhado ao bolsonarismo – e os postos de comando de todos os órgãos federais que tratam da pauta indígena, inclusive em outros ministérios como:
• a Secretaria de Saúde Indígena, SESAI, do Ministério da Saúde;
• 34 distritos especiais indígenas, DISEI;
• 39 coordenações regionais, cargos ocupados até 2022 por personagens indicadas por políticos, muitos dos quais não sabiam diferenciar um arco de uma flecha.

A participação no governo exigiu um permanente trabalho de Guajajara para convencer lideranças que resistiam em participar de governo. No meio da eleição do ano passado, ela convidou o presidente Lula para um evento no Acampamento Terra Livre, em Brasília, onde o então candidato prometeu criar o ministério.

A prioridade do MPI são:
• as desintrusões e proteção de territórios atualmente ocupados por invasores,
• retomada das demarcações,
• homologações e a segurança das comunidades indígenas.

São medidas que, segundo a ministra, devem ser incluídas na meta do desmatamento zero até 2030.

É nas TI s, segundo ela, que se registram as maiores quedas do desmatamento, resultado da relação natural do indígena com a proteção das florestas, da retirada e proibição de novas invasões.

A meta é também melhorar a produção de alimentos e criar um inédito programa de habitação popular rural indígena, um recorte do Minha Casa Minha Vida, mas com engenharia adaptada ao modo de vida de cada etnia, tudo “pensado, elaborado e executado por uma política indígena”.

Empolgada, Guajajara adotou uma nova palavrinha no vocabulário: transversalidade, uma preocupação que a tem levado a buscar parcerias com outros ministérios, especialmente Justiça e Segurança Pública, Saúde, Educação, Meio Ambiente, Mulher, Direitos Humanos, Cidades e Defesa, que até aqui executaram isoladamente boa parte da política indígena.