Na contramão do direito internacional, os Estados Unidos, a mando de Donald Trump, vêm deportando em massa brasileiros que tentam entrar de maneira ilegal no país cruzando a fronteira com o México ou que estejam em busca de asilo. Ao todo, 17.900 brasileiros foram capturados pelas patrulhas americanas, desde o dia 1º de outubro de 2018. Ao pedirem asilo na fronteira são, automaticamente, enviados ao México e ficam apreendidos em um terceiro país, a fim de esperar o término da tramitação do processo. Incoerente é a palavra para classificar o que Trump faz com os imigrantes, ainda que amparado pelo programa Protocolo de Proteção do Imigrante (MPP, na sigla em inglês). Abandonados em um país onde não queriam estar, em centros de detenção, imigrantes relatam dificuldade em se comunicar com parentes e denunciam a comida fria e ruim. “Buscar asilo não é imigração ilegal — é algo protegido pelas leis internacionais para garantir que os países não enviem pessoas de volta a lugares onde suas vidas ou liberdade são ameaçadas”, disse Clara Long, pesquisadora sênior da Human Rights Watch EUA. Para deportar todos, serão necessários pelo menos sessenta voos.

Em Ciudad Juárez, no México, eles aguardam a tramitação do processo por um tempo indeterminado, pois cada caso é analisado de maneira individual. Por isso, o direito internacional não aconselha a deportação em massa, já que há situações jurídicas diferentes. No limbo da espera, deportados ficam perdidos com muitas perguntas e poucas respostas. “Eu tinha uma audiência marcada, tudo estava marcado, mas eles não me deixaram ficar nos Estados Unidos”, explicou à Reuters a brasileira Tânia Costa. Além de Trump transferir suas responsabilidades para a terceiros, a justificativa do México para mediar a deportação é a boa relação diplomática com o Brasil. O número de apreensões na fronteira EUA-México também é uma forma de o presidente americano justificar o polêmico muro que separa os dois países, que já consumiu US$ 5,6 bilhões. “É uma política perigosa e prejudicial. Ela permite que os oficiais de fronteira dos EUA retornem os requerentes de asilo não mexicanos para locais perigosos no México, pois suas reivindicações são julgadas nos tribunais de imigração, quase todos sem o benefício de assistência legal”, afirmou Clara.

Situação Precária

No Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins, no dia 24, cinquenta brasileiros deportados chegaram praticamente sem mala e sem cuia. Com poucos pertences em mãos, eles viajaram dos Estados Unidos até a capital do México algemados e precisaram colocar todas suas coisas em uma pequena sacola plástica. Alguns só tinham a roupa do corpo. Esse é o segundo voo que chega ao Brasil com deportados. Setenta voltaram para a capital mineira no dia 26 de outubro do ano passado. “No Direito Internacional aconselhamos que essas deportações sejam pontuais, em determinados casos específicos. Um acordo no Brasil previa que, se ocorressem, elas seriam feitas caso a caso e não seria permitida a deportação em massa”, esclarece o cientista social Leandro Consentino, professor do Insper.

O recrudescimento das políticas imigratórias é um aceno de Donald Trump ao seu eleitorado e, apesar de se tratar de uma mudança drástica em relação ao governo Obama, não é uma surpresa. Trump levou a maioria dos votos americanos ao levantar a bandeira do nacionalismo, contra a entrada de imigrantes no país. Jair Bolsonaro demonstra não estar preocupado com a expulsão dos conterrâneos e aproveita a onda para firmar relações com os Estados Unidos. Em discurso em Nova Délhi, na Índia, ele declarou: “Em qualquer país do mundo onde as pessoas estejam de forma clandestina é um direito daquele chefe de Estado, usando da lei, devolver esses nacionais”, disse. Pela situação precária dos brasileiros e pelas reações de Trump e Bolsonaro, a integração global, idealizada a partir dos anos 1990, virou mesmo letra morta.