“As pessoas não devem se envergonhar de ter dívidas e por isso devem procurar meios eficientes para resolver o problema dentro da sua capacidade de pagamento”
Vanessa Lobato, vice-presidente de varejo do Santander (Crédito:Keiny Andrade)

Avançar no cheque especial e prorrogar o pagamento de uma conta viraram estratégias cada vez mais comuns aos consumidores cujos recursos deixaram de ser suficientes para quitar as próprias contas. Eles dão um jeitinho para ir tocando a vida. Hoje, há 64,8 milhões de brasileiros inadimplentes, de acordo com a Serasa, empresa de análise e informações para créditos. Mesmo com a vacina e a expectativa de retomada da economia, o aumento do endividamento surpreendeu os técnicos da instituição, que esperavam melhora no cenário, mas se depararam com 1 milhão de inadimplentes além daqueles que existiam em abril de 2020, auge da pandemia da Covid. “O consumidor está se endividando para sobreviver”, diz Aline Vieira, gerente da Serasa. “O total de dívidas chega a R$ 260,7 bilhões de reais.”

O endividamento do brasileiro é uma preocupação. Tanto que às vésperas do encerramento do primeiro trimestre do ano, o mercado já está na segunda edição de campanhas de renegociação. A primeira foi em janeiro. Um dos destaques é o Feirão Limpa Nome Emergencial da Serasa – de 7 a 31 de março – em parceria com 100 empresas, como Itaú, Avon e Renner, dispostas a renegociar 33 milhões de dívidas, com valor médio de R$ 4.022,52. Há contas mais baixas. “Calculamos que 20 milhões de débitos podem ser abatidos com R$ 100 e 15 milhões, com R$ 50”, diz Aline. Elas correspondem às contas ordinárias como luz, água e telefone.

“Tenho como cliente restaurante que reduziu de 1.000 para 300 refeições servidas por dia. Em paralelo, houve o aumento dos insumos e dos alugueis” Aquiles do Carmo, consultor jurídico (Crédito:Daniela Fonseca Moura)

Não faltam incentivos para atrair o consumidor negativado. No site da Serasa, as ofertas de descontos chegam a até 95% do valor da dívida. “A vantagem não é apenas nos juros, mas na quantia originária da dívida”, explica Aline. Além do ambiente digital, o consumidor ainda pode recorrer aos endereços físicos da empresa. Foi o que fez o consultor jurídico Aquiles do Carmo, 70 anos, no início da manhã da última terça-feira, em São Paulo. “A negociação precisa de jogo de cintura. Fazer isso pessoalmente sempre é melhor”, diz ele, que representa oito restaurantes. Carmo explica que a pandemia impactou profundamente o setor. “Tenho um cliente que reduziu de 1.000 para 300 refeições servidas por dia. Em paralelo, houve o aumento dos insumos e dos aluguéis.”

Outra iniciativa é o Mutirão Nacional de Negociação de Dívidas e Orientação Financeira, que acontece de 7 a 31 de março pelo site www.consumidor.gov.br, promovido pela Federação Brasileira de Bancos (Febrabam), Banco Central, Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) e Procons de todo o País. “A plataforma concentra 160 instituições financeiras e já acumula 4 milhões de registros de consultas. A adesão é voluntária”, diz Daniele Cardoso, coordenadora do Sistema Nacional de Informações do Consumidor, da Senacon. “O site é desburocratizado e monitorado pelo Procon e Ministério Público, da Justiça e Segurança Pública”, argumenta ela, referindo-se à confiabilidade da ferramenta. Nela, encontra-se cursos de educação financeira. “Tem gente que negocia a dívida, paga a primeira prestação e não quita as demais, se reendividando.” Perante o mercado, a prática piora mais a avaliação do consumidor, comprometendo a obtenção de crédito futuro. “No mutirão, a maior parte das renegociações (80,6%) gira em torno de produtos de bancos, financeiras e administradoras cartões.”

O Banco Santander também lançou a própria campanha, batizada de “Desendivida”, que vai se estender durante o mês, quando as agências permanecerão abertas das 16h às 18h, nos dias úteis, apenas para atender casos de renegociações. Em janeiro, a mesma campanha atingiu 500 mil pessoas, com dívidas no valor de R$ 4 bilhões no total. “Estamos repetindo a ação justamente porque tivemos excelentes resultados”, diz Vanessa Lobato, vice-presidente executiva de varejo do Santander. “As pessoas não devem se envergonhar de ter dívidas e por isso devem procurar meios eficientes para resolver o problema dentro da sua capacidade de pagamento.”