A documentarista brasileira Fernanda Pessoa, que participa do Festival Cinelatino de Toulouse com “Histórias que nosso cinema (não) contava”, propõe uma reflexão sobre a “pornochanchada”, que durante a ditadura se tornou um canal de expressão da crítica, e acredita que o gênero atraia muitas mulheres.

“O documentário é um gênero que me parece ter cada vez mais realizadoras mulheres, principalmente se comparado à ficção”, contou à AFP Fernanda que, nesta sexta-feira, disputou em Toulouse com outras sete produções o prêmio de melhor documentário, atribuído à produção colombiana “Jericó el infinito vuelo de los días”.

Na seleção, os filmes de mulheres foram maioria, caso do filme vencedor, da cineasta Catalina Mesa.

Mesa escolheu mostrar uma realidade em extinção por meio dos relatos de um grupo de mulheres. “Elas me mostraram sua sabedoria, suas histórias íntimas de vida, suas dores e seus humores […]”, disse à AFP a diretora colombiana.

Outra concorrente, Dalia Reyes, retratou em “Baño de vida” como as mulheres garis que utilizam os banheiros públicos do México para se limpar depois do trabalho encontraram neste espaço um local de convivência para falar de suas vidas, dores, diferenças de classe e violência sexual.

O que começou como um documentário sobre estes banheiros, antes muito comuns pela falta de água corrente nas casas, mudou completamente graças à sua paciente escuta. Para filmar, ela adentrou completamente no universo das garis.

“Vivi o perigo das circunstâncias, usei o uniforme, vi o desprezo. Elas não acreditavam no início que eu fosse recolher lixo”, contou à AFP em Toulouse.

Para Reyes, as mulheres escutam mais. “Sempre disse a verdade a estas mulheres. Sempre souberam que iriam aparecer nuas. Houve um trabalho prévio de conhecê-las”, contou.

“Foi um projeto que quando contei, somente as professoras me apoiaram. Os homens me diziam: ‘nunca vai conseguir que elas se abram'”, lembrou.

Embora muitos avanços tenham sido conquistados pelas mulheres, a Fernanda Pessoa acredita que possam estar em risco.

“No Brasil, tivemos avanços importantes nesse sentido nos últimos anos, com ações afirmativas do Estado. No entanto, no contexto político atual do Brasil, esses avanços correm um sério risco”, afirmou.

“O olhar feminino é cada vez mais necessário nesse momento em que vemos um pensamento conservador voltar com muita força em diversos países”, concluiu.