Constantemente, lutadores do UFC se queixam do baixo valor que recebem para competir. Campeões, além das principais estrelas da organização, alegam ganhar muito menos que os grandes nomes do boxe ou até de celebridades que se arriscam no mundo das lutas. Dana White, o chefão da modalidade, rebate dizendo que o negócio não sobrevive sem os moldes atuais.

Nada disso incomoda Maria Oliveira, lutadora brasileira do peso-palha (até 52 kg), que entre uma luta e outra busca distintos serviços em Las Vegas, cidade que reside nos EUA desde setembro de 2021. “Eu não ligo de trabalhar, trabalhei a minha vida toda. Minha mãe pegava ferro velho e eu ia junto com ela. Aqui (em Las Vegas), já trabalhei de tudo. Se aparece algum serviço, pego. Babá, algumas aulas… Se não atrapalhar (os treinos), não tem problema”, disse Maria Oliveira ao Estadão.

Assim que chegou na badalada cidade americana, Maria conta que trabalhou lavando louça, de garçonete e manicure para outros brasileiros na cidade. Babá por US$ 15 a hora e aulas de lutas por US$ 50 a hora também estão no seu leque profissional.

Jéssica Andrade, ex-campeã do UFC na própria categoria palha, ajudou a compatriota a entrar no país e bancou os seus três primeiros meses de aluguel. Isso deu um alívio para a recém-chegada adquirir o seu próprio carro e conciliar os trabalhos com os treinamentos.

“Uma luta só por ano não dá (para sobreviver nos EUA), precisa ser umas duas ou três. Se eu estivesse no Brasil, com a conversão para o real, daria para viver bem. Mas sei que aqui é o melhor para a minha carreira. Foco melhor nos treinos, vou evoluindo e tenho muito mais chances de vencer minhas lutas. Mais para frente, pegando o cinturão, eu volto para o Brasil. Tenho muita saudade. Mas agora sei que o melhor é estar aqui, mesmo que isso represente um pouco mais de aperto, ter de levar uma vida mais regrada”, diz a atleta.

Maria Oliveira começou a se apaixonar pelas lutas na adolescência. Com 13 anos, teve o contato com a capoeira. Aos 14, foi para o jiu-jítsu. Dividindo o tatame com a turma de kickboxing, não conseguia se concentrar na sua aula de tanto fascínio e pediu para mudar. Logo passou a competir e a vencer duelos com meninas mais velhas e mais pesadas. Muitas vezes fazia mais de um combate por noite. No entanto, o apoio familiar não veio de cara.

“Eles achavam que era coisa de vagabundo, preguiçoso, achavam que não era coisa de mulher. Achavam que eu queria fugir das responsabilidades da casa, pois quase todas as obrigações de casa era eu que fazia. Hoje, até entendo, na época não entendia. Mas hoje eles me apoiam 100%.”

O UFC ainda não estava nos planos de Oliveira, que acompanhava somente as poucas lutas na TV aberta. Anderson Silva e José Aldo, campeões dominantes na época, eram os seus preferidos. A luta em pé, estilo das duas lendas, é uma especialidade até os dias de hoje da lutadora.

PENETRA DA ANITTA

Maria Oliveira ficou conhecida nacionalmente não por seu trabalho, mas, sim, por invadir uma festa da cantora Anitta em Las Vegas, realizada em abril deste ano. Após o caso se tornar público, a lutadora ganhou mais de 100 mil seguidores em sua rede social.

“Eu e minha amiga já fomos vestidas para a festa, confiantes de que entraríamos, e deu certo”, conta ela, que teve de se misturar com outros convidados para passar batida pela recepção. No dia seguinte, a cantora queria saber quem era a penetra carismática que havia entrado em seu evento particular, organizado para pouco mais de 200 pessoas. Maria se apresentou e as duas mantêm contato até os dias atuais.

“A gente conversa sempre. Ela esteve mais duas vezes aqui em Vegas e me chamou para ir encontrá-la. Quando ganhei a última luta, ela me deu os parabéns e também às vezes comenta os meus stories no Instagram”, relata a fã e agora amiga.

Cantora e lutadora têm outra coisa em comum: o gosto pelos jogos. Anitta joga e é garota propaganda do Free Fire, jogo online de muito sucesso. Maria joga o mesmo jogo e não tem vergonha em pedir uma forcinha. “A gente joga junto. De vez em quando peço uns códigos a ela. Ela me arruma. Eu jogo pelo celular e ela pelo computador”, conta Maria.

PRÓXIMA DESAFIANTE ERA STRIPPER

Maria Oliveira já está com luta marcada para o dia 19 de novembro, em evento ainda sem local, mas que provavelmente ocorrerá em Las Vegas. A adversária será a americana Vanessa Demopoulos, que vem de duas vitórias seguidas no UFC. O curioso é que Vanessa também conciliava a luta com outra atividade. Até o fim do ano passado, a atleta de 33 anos era também dançarina de strip-tease e somente neste ano ela passou a se concentrar integralmente à carreira de lutadora.

A brasileira, hoje com 25 anos, soma uma vitória e uma derrota na organização e adianta que vem trabalhando bastante o seu jogo de chão, pois a rival costuma pegar bem nas finalizações.

Maria enfrentou somente brasileiras no UFC, derrota contra Tabatha Ricci e vitória diante de Glória de Paula, ambas por decisões dos juízes. Pela primeira vez vai encarar uma estrangeira, o que para ela faz toda a diferença. “Eu acredito muito em energia. A vibração da torcida se divide com duas brasileiras. Eu não gosto. Gosto de defender o Brasil. O brasileiro luta mais para conseguir tudo o que consegue. O americano, o estrangeiro, têm as coisas mais fáceis na vida”, analisa Oliveira, que sonha em lutar no Brasil, mas o próximo evento, em janeiro, não terá tempo suficiente.

Com muitas brasileiras no top 10 de sua categoria, ela sabe que continuará cruzando com as compatriotas, mas mira duas lutas contra ex-campeões que, em sua opinião, levariam prêmio de performance da noite, no valor de US$ 50 mil (R$ 257 mil).

“Eu queria muito enfrentar a Zhang Weili e a Rose (Namajunas). É um muay thai muito bonito e eu amo lutar com striker, acredito que me solto mais. Seriam duas lutas incríveis, o Dana White daria o prêmio com certeza”, brinca a brasileira, que revela planos de investimentos e deseja encerrar sua carreira aos 35 anos, visando até lá já ter feito o seu pé de meia. “Não quero ser igual a Holly Holm (lutadora com 40 anos de idade).”