Existem diversas maneiras de se recuperar obras de arte roubadas: dos escombros de terremotos e outros desastres, de saques de guerras e de antigos naufrágios, isso sem falar em peças negociadas por criminosos para antiquários mundo afora. Ao inaugurar o Museo dell’Arte Salvata, o ministro da Cultura da Itália, Dario Franceschini, elogiou o trabalho da “polícia da arte” do país, batizada de Comando Carabinieri para a Proteção do Patrimônio Cultural. A primeira exposição do museu, que vai até 15 de outubro e é sucesso de público na capital romana, se concentra na recuperação de cerca de 100 peças, entre eles vasos e esculturas greco-romanas, além de moedas produzidas entre os séculos VII e III (A.C.).

PATRIMÔNIO Dario Franceschini, ministro de Cultura italiano: elogios ao trabalho da “polícia da arte” pelo resgate das peças (Crédito:Divulgação)

A ideia do espaço, um amplo salão construído como parte das Termas de Diocleciano, anexo ao Museu Nacional Romano, é devolver os objetos aos seus locais de origem após permanecerem por um período no local. O acervo estará em contante renovação, permitindo a discussão entre público e crítica não apenas em relação ao que é arte, mas também sobre qual o seu destino. De acordo com o Ministério da Cultura italiano, devolver os objetos recuperados aos museus mais próximos do local de onde provavelmente foram saqueados é um processo árduo, dada a natureza clandestina das escavações. Vale lembrar que a Itália, com séculos de ocupação humana, é rica em sítios arqueológicos e até mesmo uma reforma de rotina no quintal de casa pode fazer surgir um tesouro.

A principal estrela do museu atualmente é um grupo de estátuas de terracota datadas do século IV A.C. exportadas ilegalmente para os EUA, que estavam em posse do Museu Getty, de Los Angeles. Originárias da Puglia, no extremo-sul italiano, e encontradas durante uma escavação clandestina, as esculturas têm tamanho natural e representam o poeta Orfeu sentado e duas sereias de pé. A devolução das estátuas era reivindicada pelo governo da Itália desde 2006 e só foi possível graças ao trabalho conjunto dos dois países. “Quando uma obra de arte de tão inestimável valor retorna ao seu território de origem é uma grande conquista para todos. Não só para o mundo da arte e da arqueologia, mas para todos os países que retomam peças fundamentais de suas origens e, portanto da sua cultura”, afirmou Stéphane Verger, Diretor do Museu Nacional Romano. Após a parada em Roma, o conjunto deverá voltar para Puglia.

Para Maria Izabel Branco Ribeiro, professora de História da Arte da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), privar uma obra de seu local de origem provoca efeito danoso em muitas culturas. Ela cita obras pré-colombianas, muitas com significado espiritual para seus respectivos povos, como exemplo de apropriação indevida. “São objetos sensíveis para esses povos. É uma ideia que vai além da beleza: recuperar objetos com esse perfil é uma questão moral”, explica. A questão da “devolução de arte” gera polêmica no mundo da arte há tempos. Com o novo museu italiano, a discussão se amplia. Se o Museu Britânico, na Inglaterra, pode ficar com os relevos pertencentes ao Parthenon, na Grécia, por que há peças que deveriam voltar a seus países?

ORIGENS Mostras temporárias: obras resgatadas são exibidas no salão construído em uma ala das Termas de Diocleciano (Crédito:Divulgação)

Para a professora Maria Izabel, há diferentes perspectivas sobre o tema. Uma corrente de pensadores defende que, em um mundo globalizado, preocupado com a divulgação e preservação cultural, devolver uma obra é também uma reparação histórica. Outra corrente, no entanto, acredita que certos objetos têm mais visibilidade nos grandes museus do que em pequenos espaços em locais remotos, sem contar a capacidade financeira de países emergentes para manter essas obras. “O Museu Nacional do Rio de Janeiro, que pegou fogo, é um exemplo de que, às vezes, é importante pensar no destino que a obra terá.” Essa é uma discussão que ainda vai durar muito tempo.

Riquezas
Mais de cem obras, entre cerâmicas, vasos e esculturas greco-romanas e etruscas, dividem espaço com moedas produzidas entre os séculos VII e III A.C.

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