Escritório de comércio americano classificou indiretamente o sistema de pagamentos como uma prática comercial desleal. Em publicação, Palácio do Planalto disse que o "Pix é dos brasileiros".O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu nesta quarta-feira (16/07) à investigação imposta pelos EUA contra o que a Casa Branca chamou de "práticas comerciais desleais" do Brasil.
Em publicação nas redes sociais, o perfil oficial do Palácio do Planalto defendeu o sistema de pagamentos instantâneo Pix, que foi indiretamente citado pelos EUA como um risco à "competitividade de empresas americanas que atuam no comércio digital e em serviços de pagamento eletrônico".
"O Pix é do Brasil e dos brasileiros. Parece que nosso Pix vem causando um ciúme danado lá fora, viu? Tem até carta reclamando da existência do nosso sistema Seguro, Sigiloso e Sem taxas", escreveu o governo brasileiro na publicação.
"Só que o Brasil é o quê? Soberano. E tem muito orgulho dos mais de 175 milhões de usuários do Pix, que já é o meio de pagamento mais utilizado pelos brasileiros", completou, endossando o discurso favorável à soberania do país repetido por Lula após o presidente dos EUA, Donald Trump, taxar produtos brasileiros em 50%.
EUA acusam "práticas desleais"; Alckmin rebate
Sem citar diretamente o Pix, o Escritório do Representante Comercial dos EUA disse na terça-feira que o Brasil parece se envolver "em uma série de práticas desleais com relação aos serviços de pagamento eletrônico, incluindo, mas não se limitando a favorecer seus serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo".
O Pix é o único serviço de pagamento eletrônico desenvolvido pelo governo brasileiro. O lançamento do sistema tirou força de modelos lançados por empresas americanas, como o Google Pay ou a ferramenta de pagamentos do WhatsApp, que foi descontinuada no ano passado.
O órgão americano também acusou o Brasil de práticas irregulares referentes à propriedade intelectual e restrições às plataformas de redes sociais.
O vice-presidente Geraldo Alckmin, que tem sido escalado por Lula para liderar as negociações com a Casa Branca, também defendeu o Pix em reunião com empresários nesta quarta-feira.
A jornalistas, Alckmin disse que o sistema de pagamentos é um "sucesso" e que o Brasil irá explicar ponto a ponto os questionamentos elencados na investigação comercial dos EUA.
Para o vice-presidente, mais urgente do que tratar da questão do Pix é impedir a imposição de sobretaxa aos produtos brasileiros, anunciada por Trump para ter início em e 1º de agosto.
"O que precisamos resolver é a questão tarifária, porque ela não se justifica nesse patamar", disse Alckmin. Segundo ele, é ponto pacificado entre os empresários que o Brasil precisa negociar com os EUA. "É urgente. O bom é que se resolva nos próximos dias, se houver necessidade nessa negociação de prorrogar [a implementação das tarifas], não vejo problema. Agora, o importante era resolver. Você buscar uma solução. Esse é o sentimento geral", disse.
Em carta, Brasil pede negociação
Na terça-feira, o governo brasileiro já havia enviado uma carta assinada por Alckmin ao mesmo Escritório do Representante Comercial dos EUA, que abriu a investigação. O conteúdo do documento foi revelado pelo Palácio do Planalto nesta quarta-feira.
No documento, primeira manifestação formal do governo desde a troca de farpas entre Lula e Trump, o vice-presidente e o chanceler Mauro Vieira se disseram "indignados" pela imposição tarifária, mas propuseram a abertura de um canal de negociação.
Um ofício anterior pedindo diálogo foi enviado pelo Brasil em maio, antes da escalada de tensões entre Brasília e Washington, mas não foi respondido pelos americanos.
Nunes defende 25 de Março
Em sua investigação, o governo americano também cita as operações comerciais da Rua 25 de Março, em São Paulo, como um dos maiores polos de produtos falsificados no Brasil. O Escritório de Comércio dos EUA aponta o comércio da região como um indicativo de que o governo brasileiro falha em impor direitos de propriedade intelectual.
A afirmação instou lojistas da região a publicarem uma nota conjunta, indicando que o comércio irregular no local ocorre de forma pontual e é continuamente combatido pelos órgãos públicos competentes.
"Esses casos não representam a imensa maioria dos lojistas da região, que atuam de forma legal e transparente", disse a União dos Lojistas da 25 de Março.
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, disse que fiscais atuam na região para coibir ilegalidades.
"O comércio da 25 de Março não pode ser considerado um comércio ilegal, pois não é. Se em algum local existir venda de produtos falsificados, inclusive na 25, cabe à Receita Federal e órgãos de combate à pirataria fiscalizar e terá, como já tem, todo apoio da prefeitura", disse.
Legislativo e Executivo se unem contra "agressão" americana
Membros do governo brasileiro têm associado a abertura da investigação comercial com a pressão de Trump contra o Judiciário brasileiro para coibir uma condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Mas as novas medidas americanas amenizaram os recentes atritos entre Executivo e Legislativo em pautas econômicas e provocaram os presidentes da Câmara e do Senado a lançar uma manifestação junto ao governo Lula.
Em vídeo ao lado de Alckmin e do presidente da Câmara dos Deputados Hugo Motta publicado nesta quarta-feira, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, assegurou que o Congresso Nacional está unido em prol da defesa dos interesses brasileiros contra o que classificou como uma "agressão" por parte do governo dos Estados Unidos.
"O parlamento brasileiro está unido em torno da defesa dos interesses nacionais. Tenho conversado muito com o presidente Hugo Motta com relação a esses últimos acontecimentos e temos a compreensão de que nós, o Poder Legislativo, vamos defender a soberania nacional, os empregos dos brasileiros e os empresários brasileiros", declarou Alcolumbre.
Tarifas geram disputa no bolsonarismo
Entre os apoiadores de Jair Bolsonaro, porém, o movimento gerou divisões. O deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, que articula sanções contra o Judiciário brasileiro nos EUA, atacou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, pela tentativa de negociar diretamente com os americanos uma redução nas tarifas.
"Para você, a subserviência serviu às elites é sinônimo de defender os interesses nacionais", escreveu Eduardo Bolsonaro. Ele defende que as tarifas sejam retiradas se o Congresso brasileiro aprovar uma anistia em favor de réus indiciados pela tentativa de golpe de Estado.
Jair Bolsonaro, por sua vez, disse nesta terça-feira ser "apaixonado" por Trump e pelos americanos. "Ele me tratava, me trata como irmão, e ele botou naquela carta primeira linha meu nome. Está sendo caça às bruxas ou não?", questionou em entrevista ao Poder 360.
gq (OTS, Agência Brasil)