Dos smartphones aos automóveis, os semicondutores são os maestros invisíveis que regem o funcionamento de qualquer dispositivo eletrônico. Com a ascensão da inteligência artificial, essa discussão assume uma relevância ainda maior, pois esses pequenos componentes são a espinha dorsal do processamento de dados e consequentemente determinantes para o futuro da tecnologia.

Não por acaso, estamos diante de uma corrida global pelo domínio na produção de semicondutores — uma verdadeira batalha dos chips. Países como China, Índia, Estados Unidos e a União Europeia estão despejando quantias vultosas de dinheiro para expandir a fabricação e exportação desses componentes.

Os semicondutores são peças fundamentais em uma ampla gama de produtos, desde dispositivos eletrônicos até equipamentos industriais avançados. Sua demanda global é alta, tornando o mercado extremamente competitivo e vital para a economia mundial.

Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), o déficit comercial do setor de componentes eletrônicos foi de US$ 38,6 bilhões em 2022.

O consumo de semicondutores no Brasil em 2021 foi da ordem de US$ 11 bilhões, mas apenas 8% dessa demanda foi atendida por fabricantes nacionais.

“O Brasil carece de investimento em tecnologia. A indústria brasileira está estagnada e precisando de investimentos que permitam estimular o seu crescimento”, declara Wânderson de Oliveira Assis, professor de Engenharia Eletrônica do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT).

Brasil quer produzir semicondutores, com apoio do BNDES. Entenda os desafios
(John Thys)

Em meio à recente crise global de semicondutores estabelecida pela pandemia da Covid-19 e essa busca de fortalecer a base tecnológica do País e reduzir sua dependência de importações em um setor crucial para diversas indústrias, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tomou uma decisão estratégica ao financiar a produção desses componentes no Brasil. “Vejo como uma tentativa de aproveitar uma oportunidade geopolítica para o Brasil entrar na cadeia global de semicondutores”, analisa Josilmar Cordenonssi Cia, professor de finanças da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

A aprovação do significativo financiamento do BNDES de R$ 290 milhões para a empresa de tecnologia Adata, sediada em Taiwan, com o objetivo de produzir chips semicondutores no Brasil faz parte do Programa BNDES Mais Inovação que busca fomentar iniciativas que reduzam a dependência tecnológica do país e fortaleçam sua base de tecnologia. “Os investimentos vão fortalecer a base de tecnologia e contribuirão para tornar o País menos dependente de importações, o que é crucial para a segurança e a soberania tecnológica”, explica o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante.

“É fundamental que o BNDES volte a ter o seu papel, claro que com responsabilidade. O BNDES precisa realmente ser usado como um elemento de alavancagem desse processo de autonomia do País em relação a outros mercados”, avalia Ricardo Balistiero — doutor e professor de Economia do IMT.

Brasil quer produzir semicondutores, com apoio do BNDES. Entenda os desafios
(Divulgação)

“Uma política de Estado que aproveite os recursos de pesquisa e recursos naturais, aliada à visão estratégica de cadeias produtivas para uma economia futurista, pode posicionar o Brasil de forma relevante no cenário geopolítico.”
Celso Camilo, Vice-Diretor do CEIA

Os semicondutores produzidos no Brasil pela Adata serão destinados a uma ampla gama de dispositivos eletrônicos, incluindo:
• notebooks,
• desktops,
• servidores,
• televisores,
• automóveis,
• e celulares.

Essa iniciativa também está alinhada com os objetivos da Nova Indústria Brasil, política que visa reduzir a dependência produtiva e tecnológica em produtos nano e microeletrônicos e semicondutores. “Além disso, espera-se uma geração considerável de empregos e renda, juntamente com o estímulo para atrair mais investimentos para o setor”, avalia Arthur Igreja, especialista em Tecnologia, Inovação e Tendências.

Nova Indústria

Para a Adata, empresa beneficiada pelo financiamento do BNDES, a implementação da produção de semicondutores no Brasil enfrentará desafios significativos, dada a complexidade e a tecnologia envolvida nesse processo. Uma política de Estado que considere as potencialidades dos centros de pesquisa, recursos naturais (por exemplo: silício e cobre) e tenha a visão estratégica de cadeias produtivas voltadas para uma economia do futuro pode colocar o Brasil em posição relevante no “tabuleiro geopolítico”, diz Celso Camilo, vice-diretor do Centro de Excelência em Inteligência Artificial (CEIA).

Olhando para o futuro, o setor de semicondutores no Brasil enfrenta o desafio de implementar e manter políticas e planos existentes, como o Programa CI-Brasil, PADIS e Nova Indústria Brasil. “Vale lembrar, como exemplo da dificuldade de continuidade, que o Brasil criou uma empresa pública, o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (CEITEC), que foi desativada e retomada recentemente”, explica Camilo.