Conversando com amigos sobre o que vivenciamos hoje no Brasil, um deles puxou o celular e foi buscar na web o conceito de dicotomia, que é a divisão de um elemento em duas partes, em geral contrárias, como a noite e o dia, o bem e o mal, o preto e o branco, o céu e o inferno. Esse meu amigo trabalha no mercado financeiro, é frequentador da Faria Lima, em São Paulo, segue a cartilha dos economistas de Chicago e enxerga um mundo muito diferente de mim. Embora tenhamos uma relação que considero saudável, somos exemplos vivos de dicotomia.

Ele enxerga um Brasil no rumo certo e diz que só não crescemos nesses últimos anos porque tivemos pela frente uma pandemia. “A crise é mundial, veja os números. Não é exclusividade nossa”, ele diz. Sei que a crise é mundial, sempre foi, mas discordo da lógica desse mercado. Assim também como discordo da ideia do que ele pensa sobre um país mais justo. Dia desses me mandou uma mensagem com dados que indicavam o Brasil como um dos países com a vacinação mais avançada e que eu não deveria criticar a inação do governo nesse sentido. Mais uma vez discordei: Bolsonaro fez de tudo para retardar e impedir o início da vacinação.

Assim como esse meu amigo, há outros tantos por aí. Eu diria que algo em torno de inacreditáveis 20 ou 30% da população, conforme pesquisas de opinião, sustentam as teses do meu amigo. É uma espécie de núcleo duro, difícil de ser atingido de perceber o que realmente acontece no Brasil. Alguns são vacinados, muitos não. Outros acreditam num Messias, mas não acreditam na ciência. Há os que mentem e há os que aceitam a mentira como verdade. Há os que não entendem e nem se esforçam para entender o que está acontecendo. Há os que nunca entenderam nada mesmo e, por isso, ressentidos. E há aqueles que se divertem e lucram com todo esse desmonte do que um dia conhecemos com o Brasil que dá certo.

Vamos precisar de muito empenho para voltarmos a ser um povo reconhecido por nossa cordialidade. Digo mais: vai demorar um bom tempo para que voltemos a conquistar credibilidade mundo afora e, principalmente, mundo adentro. Qual é o Brasil de verdade e o Brasil de mentira, afinal? É o Brasil que queima suas florestas ou o país que mais investia na preservação do meio ambiente? É o Brasil que voltou para o Mapa da Fome ou o país que luta para não se transformar numa Venezuela? É o Brasil que flerta com ditadores ou o País que nos livra de uma terceira guerra mundial, como dizem os bolsonaristas? Está tudo meio confuso, eu sei. E deve ser de propósito. E você? Em que Brasil você quer viver?