Na semana passada uma foto divulgada por redes sociais mostrava, em uma prateleira de mercado, um pacote de Doritos vendido a R$ 21,99 ou em duas parcelas, “sem juros”, de R$ 11,00 (portanto, havia juros, sim: de um centavo). Nestes tempos de deepfakes, não dá para constatar, de cara, se é uma foto forjada, mas no País “em que se plantando tudo dá” — trecho da carta de Pero Vaz de Caminha, há mais de 500 anos –, não há mais espantos. Vimos a corrida ao caminhão de ossos, as pelancas de aves vendidas nos açougues, assim como o arroz quebrado apresentado como “oferta”.

Verdade é que, nesta dimensão — não aquela em que alguns vivem, dizendo que ninguém passa fome –, são 33 milhões em situação de vulnerabilidade, aquela em que se acorda sem saber se vai comer. De novo: são mais de trinta e três milhões de pessoas deste País que não sabem se terão o que comer durante o dia. Um aumento de 14 milhões desde 2020. E outros 125 milhões comem mal ou pouco.

Somos quantos, os que não precisam batalhar por comida a cada dia, dos 212 milhões que o Banco Mundial estima? Esse, aliás, se preocupa — e muito — em ter todas as informações sobre a população brasileira, enquanto o IBGE inicia o censo atrasado, depois de correr o risco até de ser extinto, com todos seus dados importantíssimos para se preparar quaisquer diretrizes sócio-econômicas. Classe média metida a besta ou não, vemos produtos com preços mantidos e quantidades reduzidas. Não que alguém ainda seja enganado por esse tipo de manobra. Simplesmente se engole a isca, pela ilusão de se evitar preços voadores.

O Brasil está arrasado: na economia, na política, na cultura, no esporte, na ciência. Onde mais? Na saúde. E agora o governo federal (desse mesmo que alterna “caras” de candidato) envia o projeto do Orçamento 2023 com o corte de nada menos que 59% de recursos do Farmácia Popular, que provê medicamentos basicamente para asma, diabetes e hipertensão (pressão alta que deve afetar 90% do total da população, hoje, pela “tranquilidade” em que vivemos). Devem “sobrar” R$ 842 milhões para remédios gratuitos do ano inteiro, porque o corte foi bem acima disso: de R$ 1,2 bilhão. Ah, mas “em compensação” emendas incluídas no orçamento da saúde (em favor de quem, mesmo?) cresceram 22%.

Só penso quando vou poder usar de novo a palavra “inacreditável”, que está riscada do meu dicionário.