As sucessivas crises políticas e fracassos econômicos das últimas décadas geraram uma sociedade egoísta, narcisista, individualista e inimiga das questões sociais, culturais e inclusivas, típicas da sociedade contemporânea. O crescimento destas demandas não encontra receptividade por uma parcela considerável da população. E na estrutura de Estado há uma disfunção que se manifesta em decisões do Judiciário favoráveis ao que determina a Constituição e a ação concreta do Executivo criando sucessivas dificuldades para o enfrentamento das mesmas questões. O STF parece muito mais à frente do que o Executivo e o Legislativo. E, registre-se, não faz política. Simplesmente nas suas decisões cumpri as disposições constitucionais. Ou seja, o Brasil dos anos 1980 está muito mais avançado do que o Brasil dos anos 2020.

O desprezo pelo coletivo, pela nacionalidade, pelo destino comum de uma nação, transformou o nosso País em um conjunto de ilhas que não se comunicam entre si. Isto em vários campos: o da política, da vida social, cultural. A fragmentação é acentuada a cada dia pela ausência de políticas públicas e de uma visão de mundo que almeje a totalidade, a construção de uma identidade. Sim, hoje temos de voltar a esta questão que já esteve presente em vários momentos da nossa história. É possível dizer, agora, qual é a identidade brasileira, suas características, sua forma de ação e reafirmação da nacionalidade? Quem somos?

O desprezo pelo coletivo, nacionalidade e destino comum de uma Nação transformou o País em um conjunto de ilhas que não se comunicam entre si

A hiper valorização do indivíduo em detrimento da sociedade – marcada, inevitavelmente, pelas contradições de classe – edificou o País da barbárie, o País do cada um por si. Até o discurso religioso fortaleceu esta forma de ação. Todos não serão “abençoados”, só os “escolhidos”, aqueles que, inclusive, contribuem generosamente (monetariamente) para a obra de Deus.
O discurso do liberalismo sem conteúdo social – e entendido como “menos Estado” e mais indivíduo –, deu uma frágil sustentação a uma prática social excludente e que levou ao apagamento das desigualdades sociais. Afinal, cabe ao Estado a elaboração de políticas que possam conduzir à diminuição das desigualdades. Não será a livre manifestação do mercado que permitirá, em uma Nação tão desigual encaminhar as soluções dos graves problemas nacionais. A encruzilhada que estamos percorrendo vai definir o nosso futuro, para, no mínimo, esta década. Se caminharmos para a barbárie daremos adeus a um País que poderia ser grande. Vamos viver de recordações.