Bonito reúne aventura, arte, cultura e sabor em MS

Coluna: Flavia Vitorino

Flavia Vitorino é jornalista e turismóloga especialista em destinos e viagens de natureza. Diretora de conteúdo do aplicativo LYFX e agente de viagens pela GO Escape.

Bonito reúne aventura, arte, cultura e sabor em MS

Mergulho em Bonito (MS)
Foto: Flavia Vitorino

Antes mesmo de mergulhar em uma gruta, Bonito já provoca a sensação de se mover num intervalo do mundo: rios de transparência cristalina, onde cada peixe e cada folha parecem flutuar no ar, paredões de calcário guardam ecos de água corrente e a cidade respira um silêncio quebrado apenas quando vira palco de música e arte. Há algo quase hipnótico em caminhar entre essas duas dimensões: a da natureza, que se impõe com força bruta, e a da cultura, que se reinventa em praça pública durante o Festival de Inverno.

Nesse vaivém, Bonito deixa claro que não cabe em um só rótulo: é ecoturismo de aventura, é patrimônio subterrâneo, é gastronomia que traduz em sabor a identidade pantaneira. Um destino que, a cada temporada, parece acrescentar novas camadas ao próprio imaginário.

O Festival de Inverno e sua cenografia sustentável

O Festival de Inverno de Bonito, agora em sua 24ª edição, vive uma fase de reinvenção. Nos últimos dois anos ganhou fôlego, estrutura e visibilidade, consolidando-se como um dos mais importantes eventos culturais do Centro-Oeste. Com shows gratuitos de artistas nacionais como Titãs, Samuel Rosa, Jorge Aragão e Elba Ramalho, e programações de teatro, dança, cinema e oficinas, o evento chega a atrair cerca de 120 mil pessoas ao longo de cinco dias, movimentando a economia local e dando visibilidade ao talento de suas produções.

Projeto Siri - Foto: Flavia Vitorino

Projeto Siri

O grande destaque desta edição foi a cenografia assinada pelo Projeto Siri, coletivo conhecido por unir arte e sustentabilidade. Estruturas e instalações foram concebidas a partir de materiais reaproveitados, plásticos reciclados, tecidos descartados, pneus que em grandes composições remeteram à fauna e à flora pantaneira. A atmosfera era de celebração coletiva, mas também de consciência: cada detalhe da cenografia parecia dialogar com o entorno natural, reforçando o discurso de que cultura e meio ambiente podem — e devem — caminhar juntos.

Ecoturismo subaquático: mergulhos em grutas e cavernas

Se a flutuação em rios cristalinos consolidou Bonito no imaginário turístico, o mergulho de cilindro é o que hoje projeta o destino para outro patamar. A Gruta do Mimoso, reaberta em 2022 após mais de 15 anos fechada, voltou a encantar mergulhadores com suas galerias inundadas. Ali, formações calcárias milenares e a coloração azul-turquesa da água criam uma paisagem quase irreal. A experiência é oferecida em diferentes modalidades: desde o batismo, para iniciantes, até mergulhos técnicos em profundidades que alcançam 18 a 40 metros, reservados a mergulhadores certificados.

Gruta do mimoso - Foto: Flavia Vitorino

No Abismo Anhumas, a vivência começa antes mesmo da água: é preciso descer 72 metros de rapel guiado para acessar um lago subterrâneo escondido. Lá embaixo, um universo silencioso revela cones de calcário gigantescos submersos, alguns com mais de 20 metros de altura. A sensação é de estar em outro planeta, em um mergulho que une adrenalina, contemplação e técnica.

Abismo Anhumas - Foto Flavia Vitorino

Já os Cânions do Rio Salobra, dentro do Parque Nacional da Serra da Bodoquena, trilhas por dentro de um rio esmeralda e pela mata, cercado por paredões de até 90 metros. O percurso intercala trechos de caminhada, nado e paradas em piscinas naturais, revelando uma dimensão menos conhecida de Bonito, onde a aventura é acompanhada pelo som da água corrente e pelo frescor das matas ciliares. Juntos, esses atrativos confirmam Bonito como epicentro do mergulho e do turismo de aventura em águas interiores no Brasil.

Cânion do rio Salobra - Foto : Flavia Vitorino

Entre os atrativos subaquáticos de Bonito, poucos têm a aura da Lagoa Misteriosa. Localizada em Jardim, a cerca de 40 km da cidade, ela é considerada uma das cavernas inundadas mais profundas do Brasil. Até hoje, não se sabe a real extensão do poço: o mergulho mais fundo já registrado alcançou 220 metros, mas o fundo nunca foi encontrado.

Lagoa Misteriosa - Foto Flavia Vitorino

O visitante pode escolher entre flutuação, mergulho de batismo ou mergulho técnico com cilindro — e é justamente este último que revela a grandiosidade da lagoa. A visibilidade chega a ser de mais de 40 metros, criando a sensação de estar suspenso em um espaço sem chão. A água cristalina, em tons que variam do azul ao verde conforme a luz incide, dá ao mergulho uma atmosfera quase hipnótica.

Em Bonito, todas essas experiências só podem ser realizadas com o acompanhamento de uma agência credenciada — um sistema criado para controlar o número de visitantes e preservar os ecossistemas. Nesse contexto, a Bonitour atua como uma das principais organizadoras locais, conectando viajantes a mergulhos, flutuações e trilhas com a segurança de quem conhece os bastidores de cada atrativo. Hoje, a agência centraliza tudo em um aplicativo próprio, onde é possível fazer reservas, realizar check-in e acompanhar cada detalhe da programação sem complicações.

Gastronomia: a cozinha de Bonito no Casa do João

Após dias intensos de atividades, é à mesa que Bonito revela outra faceta de sua identidade. O restaurante Casa do João, comandado pelo chef Felipe Caran, é um dos mais emblemáticos do destino. Fundado originalmente pelo pai, João Vizcaino, o espaço cresceu e se tornou referência gastronômica nacional, listado entre os 100 melhores restaurantes do Brasil.

Felipe Caran da Casa de João - Foto: Flavia Vitorino

O chef Felipe Caran comanda a Casa do João

O menu combina pratos tradicionais pantaneiros com releituras criativas. Entre os destaques estão o ceviche de jacaré, a traíra sem espinhos, além de receitas com peixes de rio, como pacu e pintado, e sobremesas que celebram frutos típicos do Cerrado. O ambiente é acolhedor, com decoração que mistura peças artesanais e memórias familiares, transformando cada refeição em experiência cultural. A Casa do João é hoje ponto de encontro de viajantes e locais, reforçando o papel da gastronomia como parte central da vivência turística em Bonito.