As falas do Presidente Bolsonaro, apoiando o presidente americano quando já nem Trump consegue apoio entre os seus, são a prova de que Bolsonaro vive numa realidade alternativa.

Sem o perfil de um estadista, sem visão estratégica ou formação política relevante, Bolsonaro apoia Trump incondicionalmente, da mesma forma que sua militância fanática. A violência e o desrespeito às instituições tornaram-se um fenômeno tipicamente americano alimentado por anos de tensões raciais e sociais num pano de fundo político. Seria este mesmo quadro transportável para o Brasil? É neste sentido que as recentes declarações do presidente brasileiro podem ser interpretadas.

Trump, com uma personalidade egocêntrica e investido com um enorme poder demonstrou uma visão maniqueísta e disruptiva e, como em seus reality shows, divide a plateia em“winners” e “loosers”. A perda da presidência e da maioria do Senado certamente explica seu desequilíbrio emocional, o que não o isenta de responsabilidade nos recentes acontecimentos . No entanto, existe uma lógica trumpiana subjacente que Bolsonaro pode não ter percebido, mas que outros líderes mundiais certamente se deram conta.

Trump tentou provar que as eleições foram roubadas. Stop the Steal foi o seu moto. Não conseguiu. Nem os seus mais fiéis apoiadores nos executivos estaduais e no judiciário contestaram os resultados. Mas ele repetiu centenas de vezes, repercutidas nas redes sociais a ele alinhadas, que as eleições foram fraudadas e que a sua vitória era incontestável. Ele mente para não admitir a derrota e simultaneamente ganhar (muito) dinheiro enquanto a farsa perdurar. Negando a derrota, Trump conseguiu angariar de seus apoiadores mais de 200 milhões de dólares, supostamente destinados a combater uma fraude que ele próprio inventou. Trump sabe muito bem o que está fazendo, evitar a pecha de perdedor e levantar fundos para continuar a influir na política americana.

Trump é um exímio comunicador. Usando as redes sociais, repete mil vezes a mesma mentira até que ela se torna numa verdade. Uma prática de má memória.

Bolsonaro comporta-se como um seguidor. Não parece demonstrar o perfil de um líder que o Brasil precisa nestes momentos tão difíceis. Ao declarar que o que o Brasil está quebrado sem dizer o que se propõe a fazer para enfrentar as adversidades, não demonstra estar à altura do cargo que ocupa.

Bolsonaro parece alertar o povo brasileiro que se não houver voto impresso no Brasil, o que o STF já rejeitou, as eleições de 2022 poderão ser fraudadas e que eventos semelhantes ao ocorrido nos EUA poderiam se repetir em Brasília. Parece mesmo que ele acredita no que Trump propaga, sem ter percebido a lógica subjacente dos movimentos do americano. No entanto, Bolsonaro, com senso de oportunidade, aproveita o caos em Washington para defender a sua já conhecida posição da necessidade de voto impresso para garantir transparência e total credibilidade no processo eleitoral.