O volume avassalador de escândalos do governo Bolsonaro facilita a normalização dos crimes praticados diariamente. Essa é uma consequência nefasta da sua estratégia, pois as notícias chocantes nem despertam mais surpresa. Foi isso o que aconteceu com o depoimento na CPI do auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Alexandre Marques, nesta terça-feira (17). Ele disse com todas as letras que um documento privado foi adulterado pelo Palácio do Planalto para se transformar em instrumento do TCU contra as medidas de isolamento na pandemia e de ataque aos gestores estaduais. Ou seja, a sede do Executivo foi usada para um cambalacho rasteiro digno de falsificadores de quinta categoria, com direito a colagem de logotipo do TCU e inclusão no sistema do Tribunal na calada da noite. Ainda não está claro o envolvimento do auditor na tramoia, mas está cristalina a participação do próprio presidente da República, já que recebeu um arquivo de word de um amigo coronel (pai do auditor) e o divulgou como prova oficial do TCU em poucas horas. Tudo falso.

O episódio não representa apenas uma quebra de decoro constrangedora e amadora. Ele evidencia que o próprio presidente é a “figura central” no esquema de fake news que desestabiliza as instituições e ameaça a democracia. Essa é a conclusão a que chegou a Polícia Federal no inquérito do TSE que investiga os ataques ao sistema eleitoral, colocando na perspectiva correta o papel do próprio mandatário. As apurações provam que a rede de divulgação de notícias falsas e desinformação é um esquema lucrativo que abastece o bolsonarismo, além de ser vital politicamente. Atacar a democracia dá lucro e ajuda a preparar o golpe contra as instituições e a população.

Não é surpresa, portanto, que o governo federal esteja repleto de desqualificados e interesses escusos, como a CPI da Covid desmascarou. A dificuldade da comissão será criar um relatório consistente e de fácil leitura para a sociedade, mostrando como um esquema criminoso se apoderou do Executivo para assaltar o patrimônio público e se perpetuar no poder, usando vidas como moeda de troca e a própria saúde pública como instrumento. Esse é um crime em progresso que precisa ser contido.