O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro a oito anos de inelegibilidade por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação durante um evento com embaixadores em julho de 2022.

O placar foi de cinco votos a favor da condenação e dois contra. A ministra Cármen Lúcia, primeira a votar nesta sexta-feira, 30, acompanhou o voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, e decidiu condenar o ex-presidente por abuso de poder pelos ataques às urnas eletrônicas antes das eleições de 2022, em que foi derrotado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Bolsonaro foi julgado culpado por ter questionado as urnas eletrônicas durante uma reunião com embaixadores em julho de 2022, em Brasília.

Após o voto de Cármen Lúcia, o ministro Kassio Nunes Marques votou contra a inelegibilidade do ex-presidente. O ministro ratificou a integridade do sistema de votação e que Bolsonaro, durante a reunião com os embaixadores, não adotou um discurso contra as urnas.

Nunes Marques ressaltou que o investigado declarou que aceitaria o resultado das eleições. O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, último a votar, também acompanhou integralmente o relator.

Bolsonaro não compareceu à sede do TSE, em Brasília, em nenhuma das sessões sobre o caso. Durante a retomada do julgamento, ex-presidente esteve em Belo Horizonte (MG) para um almoço com integrantes do PL (Partido Liberal).

Bolsonaro alega inocência. “Não cometi nenhum crime ao me reunir com os embaixadores. Me acusar e tirar os direitos políticos sob acusação de abuso de poder político, você não consegue entender”, afirmou na quinta-feira.

“Narrativa delirante”

O caso gira em torno de uma reunião com diplomatas organizada por Bolsonaro no Palácio da Alvorada três meses antes de sua derrota nas urnas para Lula. Aos embaixadores, ele afirmou, sem apresentar provas, que buscava “corrigir falhas” no sistema de urnas eletrônicas com “a participação das Forças Armadas”.

Em seu discurso, transmitido pela TV Brasil e por redes sociais, o ex-capitão disse que a suposta vulnerabilidade do sistema eletrônico de votação poderia servir para manipular o resultado das eleições em benefício de Lula, o que repetiu várias vezes durante a campanha.

Os cinco juízes que votaram pela condenação de Bolsonaro criticaram muito o comportamento do ex-presidente.

O relator do caso, ministro Benedito Gonçalves, foi o primeiro a votar na sessão de terça-feira. Em sua exposição, ele afirmou que a reunião “serviu para incitar um estado de paranoia coletiva”, por meio de um “conjunto de informações falsas ou distorcidas” sobre o sistema eleitoral brasileiro.

O discurso de Bolsonaro se tornou uma “narrativa delirante com efeitos nefastos na democracia, no processo eleitoral, na crença popular em conspirações acerca do sistema de apuração dos votos, tudo praticado “não como um ato isolado e aleatório, o que já seria bastante grave, mas em verdadeira concatenação estratégica ao longo do tempo, com finalidades eleitoreiras”, afirmou o juiz André Ramos Tavares.

Durante seu discurso nesta sexta-feira, 30, Cármen Lúcia destacou que o que está em análise no julgamento “não é um filme, o que está em apreciação é a cena”, em referência à reunião de Bolsonaro com embaixadores realizada no Palácio do Alvorada em julho de 2022. “É aquilo que aconteceu e sobre o qual não se converte nos autos”, acrescentou.

“O que pode ser mais grave no agir de um chefe de Estado que, visando objetivos eleitorais, mobilizar o aparato da República para passar internacionalmente a ideia de que as eleições brasileiras não são limpas?”, disse o ministro Floriano Marques, ao votar a favor da condenação.

Abrindo divergência, o magistrado Raul Araújo, argumentou que “a intensidade do comportamento concretamente imputável não foi tamanha a ponto de justificar a medida extrema de inelegibilidade”.

Já Nunes Marques  pontuou que  constatar que a reunião com embaixadores se tratava de ato eleitoral “não implica juízo definitivo sobre o tema”.

Braga Netto

Todos os ministros que votaram absolveram o general Braga Netto, candidato à vice-presidente na chapa de Bolsonaro nas eleições de 2022. Todos os ministros entenderam que ele não teve relação com a reunião. O nome dele foi incluído no processo pelo PDT.

O futuro político de Bolsonaro

O advogado de Bolsonaro, Tarcísio Vieira, já havia antecipado que, em caso de condenação, iria recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal). Para ele, as provas contra seu cliente “são frágeis para uma sanção dessa magnitude”.

A inelegibilidade deixa Bolsonaro fora das eleições de 2024, 2026 e 2028 e abre uma disputa pela liderança da direita no país, por enquanto sem alternativas claras.

Após a derrota nas eleições de outubro (50,9% dos votos contra 49,1%), bolsonaristas radicais promoveram bloqueios em centenas de rodovias e acamparam diante de quartéis militares em todo o país, pedindo uma intervenção militar.

Em 8 de janeiro, uma semana após a posse de Lula, milhares de bolsonaristas concentrados em Brasília invadiram e depredaram as sedes da Presidência, do Congresso Nacional e do STF.

A condenação do TSE pode ser a primeira de uma série de reveses judiciais para o ex-presidente, que responde a mais de 10 processos administrativos no tribunal eleitoral.

Bolsonaro também é alvo de cinco investigações no Supremo Tribunal Federal, com penas passíveis de prisão, entre elas uma sobre seu suposto papel como autor intelectual dos ataques às sedes do Três Poderes na capital federal.

* Com informações da AFP, da Agência Brasil e do Estadão Conteúdo