O peixe morre pela boca, diz o ditado. E a sabedoria popular vale também para o presidente, que não aproveita nenhuma oportunidade de calmaria institucional em seu benefício. O último episódio aconteceu no último domingo, 18, quando saiu do hospital após uma intercorrência que, aparentemente, tem a ver com desdobramentos do atentado político que sofreu em 2018. O breve intervalo em São Paulo serviu para afastá-lo providencialmente das investigações da CPI em Brasília, que cada vez mais implicam o próprio presidente em desvios criminosos na compra de vacinas.

Ao deixar a instituição, o presidente atacou o presidente da CPI (“anta amazônica”) e sua cúpula (“três otários”). O deboche foi calculado para jogar uma cortina de fumaça nos crimes praticados contra a saúde e mobilizar aquela parcela do eleitorado que ainda se diverte com suas bravatas – é uma parcela que gira atualmente entre 15% e 30% da população e diminui diariamente. Mas, segundo os próprios aliados do presidente, trata-se de um tiro no pé.

O próprio presidente da Câmara, Arthur Lira, já havia aconselhado Bolsonaro a parar seus ataques para baixar a fervura da CPI e, ao mesmo tempo, permitir que as agendas de interesse do próprio presidente pudessem tramitar sem sobressaltos. É o contrário do que o mandatário fez. Ao insistir nas ameaças à próxima eleição se não for adotado o voto impresso, o presidente na verdade turbinou o movimento de vários partidos que se mobilizaram para enterrar o projeto. Até partidos da base do próprio presidente, como o PP, abandonaram a tese.

O problema é que o presidente precisa manter o discurso agressivo, a polarização e as teses conspiratórias para sua própria sobrevivência política. São o combustível para mobilizar a militância e gerar manchetes para os milicianos digitais e para as fábricas de robôs que inundam as redes de fake news. O paradoxo para o presidente é que essa atitude impede que ele negocie e consiga uma trégua com os outros Poderes, a começar do próprio STF. Está condenado, portanto, a manter a corda no próprio pescoço. Como o golpe tão sonhado não deve acontecer, o mais provável é que o presidente já tenha selado o seu destino – que será fatalmente um encontro com a Justiça.