Jair Bolsonaro é produto de múltiplos fatores. Passa pelo descrédito da política tradicional, pelos escândalos do mensalão e do petrolão, pelo sistema político, o voto proporcional, também pelo fracasso do processo de renovação das lideranças políticas, pela tibieza da sociedade civil, por um país invertebrado. Ao longo da história republicana tivemos apenas alguns momentos nos quais a política conseguiu ser o fio condutor das transformações econômicas e sociais. De resto, tudo foi seguindo como se a inércia caracterizasse um país sem alma, em que tudo era deixado para o dia seguinte, o mês seguinte, o ano seguinte. A pasmaceira foi, em mais de um século, eventualmente interrompida por breves momentos de lucidez, que de tão breves, não conseguiram o enraizamento necessário para se transformar em rupturas.

E assim o Brasil percorreu o século passado e adentramos o século XXI sem que concluíssemos as tarefas necessárias. Aqui, o novo — o novo de verdade — pouco após o seu nascimento logo é cooptado pelo velho. Isto acabou criando um país que combina diferentes momentos históricos na mesma conjuntura. Ou seja, o movimento da história se move de forma diferenciada e em sentidos opostos. Sendo assim não há um sentido de unidade, pois são processos tão díspares que não permitem estabelecer uma relação entre eles. Os múltiplos brasis só convivem no mesmo espaço territorial, mas são tão distintos que a cada dia vão se afastando transformando o país em um imenso arquipélago quase que autônomo.

O que poderia ser sinônimo de vitalidade é, na verdade, a mais pura tradução do caos político, econômico, sanitário e social que vivemos.

Os múltiplos brasis só convivem no mesmo espaço territorial, mas são tão distintos que o País parece um imenso arquipélago

Aldir Blanc escreveu, certa vez, que o Brazil não conhece o Brasil. Tinha razão. Mas além do Brazil (com “z” mesmo), daqueles que como brasileiros vivem como se fossem exilados, longe da “sua” terra, os Estados Unidos, temos a multiplicidade de brasis que não conseguem estabelecer um laço de união real, não a união formal. Inexiste o sentimento do coletivo, de que fazemos parte de um mesmo país, que temos — gostemos ou não — um destino nacional.

Jair Bolsonaro não é um acidente da política. Não! É produto da nossa história, destes múltiplos brasis que não conversam entre si, que não conseguem concertar um sólido laço de cidadania, de pertencimento. O primeiro passo na construção do Brasil é resolver constitucionalmente um obstáculo: enfrentar e vencer Jair Bolsonaro e seus extremistas. É apenas o primeiro passo de uma longa jornada.

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