Entre tantos desastres do governo Jair Bolsonaro, um deles deve ser louvado. Permitiu que o ultra-reacionarismo de frações da elite brasileira aflorasse. O que ficou durante as últimas três décadas relativamente escondido, no fundo do palco, nos 21 meses de Bolsonaro na presidência foi paulatinamente assumindo o protagonismo e ocupando o primeiro plano do que, no Brasil, se chama de política. O ódio, a violência, a arrogância, a ignorância, a prepotência, se transformaram em qualidades indispensáveis para o exercício de funções públicas e louvadas como uma forma original, nova, de conduzir a res publica. O decoro virou objeto de museu. No Brasil da barbárie, o chique é falar palavrões, desprezar a cultura, reduzir os complexos problemas nacionais a frases marcadas pelo senso comum, ignorar o passado e desprezar as tradições nacionais e o povo brasileiro.

O obtuso que ocupa a chefia do Executivo federal é o seu representante. Mais ainda: é a sua mais perfeita tradução. Governa o Brasil como se ainda fosse um deputado do baixo clero e com relações perigosíssimas com o mundo da marginalidade. O presidente despreza a ciência, pois é mais fácil ser negacionista sobre qualquer tema. Tem enorme dificuldade de exercer a função presidencial, suas atribuições e responsabilidades. Transformou o Palácio do Planalto numa extensão do seu antigo (e patético) gabinete da Câmara dos Deputados — por onde passou por 28 anos sem deixar nenhuma contribuição ao país. Nunca entendeu a função do Estado. Repete ladainhas pseudo-liberais sem ter a mínima ideia dos seus significados. Stuart Mill, para ele, caso um dia cometesse o desatino da leitura, seria certamente tachado de comunista. Para esconder a ignorância usa da violência e dos instrumentos do aparelho de Estado. Apesar de desprezar a Constituição, a todo o momento faz uso da Carta Magna para coagir adversários políticos e preparar, se necessário, um golpe de Estado. Tem nos nazistas bons professores. Basta recordar a utilização que fizeram da Constituição de Weimar para chegar ao poder e, posteriormente, destruí-la e impor a ditadura.

A sociedade civil, até o momento, não conseguiu reagir à altura. Há também uma enorme carência de lideranças políticas. Hoje, o importante é, a qualquer preço, agradar o parvo que ocupa a cadeira que um dia foi de Juscelino Kubitschek. Mas — e isto vale uma tese — o mandrião prefere ter um círculo íntimo, uma caterva, da sua confiança, desprezando os rastaqueras que tudo fazem para agradá-lo. E la nave va.

No Brasil da barbárie, o chique é falar palavrões, desprezar a cultura, reduzir os complexos problemas nacionais a frases marcadas pelo senso comum