Um cara desses aparece a cada dez anos. E, se pensarmos que o blues, o gênero que agoniza mas não morre e que tem em gigantes urbanas como Nova York seus maiores túmulos, esses caras são heróis. Depois de Kenny Wayne Shepperd e John Mayer nos anos 1990, Dereck Trucks e Susan Tedeschi nos 2000 e Gary Clark Junior há duas décadas, o nome que vem salvar o blues rock é Fantastic Negrito.

Seu vocal feroz atualiza o rock ledzeppeliano com mais gás no blues. Sim, ele será colocado ao lado do Greta Van Fleet por também trazer semelhanças com Robert Plant, mas sua banda não tenta ser o Led. São guitarras secas, linhas de baixo sólidas e coladas ao bumbo, muitos pratos, teclados com timbres dos anos 1970 e um corte de faca que se dá a cada momento em que Negrito volta a cantar. Plastic Hamburgers, a faixa do álbum Please Don’t Be Dead, tem tudo isso.

Ele pode ainda se distanciar do blues rock, como na balada Bad Guy Necessity ou na arabesca A Boy Named Andrew. Negrito, em seu segundo disco, já brinca mais com as peças que pode usar, desde que elas não o levem a outro mundo.

O blues carece de nomes assim. Eles não são mais bluesmen legítimos, mas revitalizam um gênero que o próprio norte-americano classe média não ouve mais. Muitos dentre os últimos dos moicanos que seguiam na estrada se foram – BB King, Johnny Winter, Magic Slim -, deixando apenas dois nomes que podem encher uma casa de shows com cinco mil lugares em qualquer país do mundo: Robert Cray e Buddy Guy.

No Brasil, o blues tem lampejos de criatividade e respiro. Depois de uma cena com casas de shows próprias e bandas que excursionavam nos anos 1990, a realidade é outra. Os maiores expoentes estão em seus casulos, como o guitarrista André Christovam e a banda Blues Etílicos. Nuno Mindelis, uma exceção, lançou recentemente um disco gravado ao vivo na Polônia, mesmo sem fazer tantos shows.

Há nomes que dão vigor à linguagem, como o ótimo guitarrista Igor Prado e o professor Marcos Ottaviano, por anos integrante do Blue Jeans. Fantastic Negrito não é Stevie Ray Vaughan, capaz de recriar cenas de blues, mas sua existência enche o coração de alegria.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.