Não é honesta a mulher que se fez dona da maior fortuna da África, no ranking feminino da revista “Forbes”. O seu nome é Isabel dos Santos, tem 46 anos e é filha de José Eduardo dos Santos, o homem que presidiu Angola entre 1979 e 2017 — nada menos, portanto, que ao longo de trinta e oito anos, mais da metade da expectativa de vida no país. Isabel, como se vê, teve tempo de sobra para cuidar de sua própria fortuna, e foi isso que fez ao lado do marido, Sindika Dokolo. Estima-se que ela seja senhora de US$ 2,2 bilhões (aproximadamente R$ 9,16 bilhões), valor que engloba imobiliárias e incorporadoras, companhias petrolíferas, empresas de extração e lapidação de diamantes e de telecomunicações. Isabel tornou-se agora o epicentro do escândalo batizado de “Luanda Leaks”, a partir de denúncias de órgãos do continente africano que lutam contra a corrupção de governantes. E ela é também, no momento, o principal alvo do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICJI), integrado por jornais e revistas de diversas nações. Angola é um dos países africanos em que reina a miséria extrema da população, sobretudo nas regiões de mineração, e, causa disso, é a festa que governantes fazem com o dinheiro público.

Isabel, bem relacionada que é (uma vez que o dinheiro, moeda impessoal, não diz sou sujo ou sou limpo para se relacionar), tomaria parte do Fórum Econômico Mundial

A imprensa portuguesa tem sido objetiva, isenta e implacável na cobertura do caso, e afirma que tudo aquilo que se viu vampirizado no erário está em contas de empresas nos paraísos fiscais de Dubai, Maurício e Ilhas Virgens Britânicas. Dentre tais empresas, destaca-se a Matter Business Solutions. A gatunagem, exercida sistematicamente, começou já no primeiro dia da gestão de José Eduardo dos Santos, mas a nebulosidade ganhou corpo em 2016 quando a companhia estatal angolana de petróleo, denominada Sonangol, sofreu uma brusca queda em suas ações devido à crise no mercado mundial. O presidente-pai nomeou, então, a filha Isabel para presidir a estatal, e assinou um decreto redigido por ela e seu marido, possibilitando a contratação de uma incorporadora em Malta para atuar na reestruturação da Sonangol – o detalhe é que tal incorporadora pertence à própria Isabel. A negociata sangrou o já sangrado povo africano e viu-se jorrar uma hemorragia de US$ 9,3 milhões. Parece que o destino de estatais de Petróleo é se tornarem arapucas nos quatro cantos do mundo – e não foi diferente com a empresa de Angola. Nas mãos de Isabel, entre tantas operações ilícitas, ela serviu também para a aquisição de parte de uma companhia portuguesa do setor de energia, chamada Galp, que atualmente vale US$ 13,4 bilhões.

CONTRASTE A miséria é extrema em Luanda, causada pela gatunagem dos governantes: José Eduardo dos Santos, pai de Isabel, foi um deles por 38 anos (Crédito:GIANLUIGI GUERCIA / AFP/AMPE ROGERIO / AFP)

Isabel, bem relacionada que é (uma vez que o dinheiro, moeda impessoal, não diz sou sujo ou sou limpo para se relacionar), tomaria parte do Fórum Econômico Mundial, na gelada cidade suíça de Davos — até porque uma de sua incontáveis empresas, essa chamada Unitel, integra o gupo de patrocinadores do evento. O jornal britâncio “The Guardian” afirmou que o nome da bilionária fora riscado do rol de convidados e que pouca gente estava lendo com bons olhos a marca Unitel. Isabel tem um meio-irmão, José Filomeno dos Santos, e uma meia-irmã, Welwitschia. Ele se encontra em péssima condição na Justiça e está sendo julgado sob a acusação de tentar embolsar US$ 500 milhões dos cofres públicos angolanos. Quanto a Welwitschia, ela era parlamentar mas sofreu impeachment no ano passado. Agora chegou a vez de Isabel, a musa do “Luanda Leaks”.