O uso de dados de celulares para monitorar o deslocamento da população criou um novo embate político entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, João Doria. O governo paulista utiliza desde o dia 9 de abril um sistema de inteligência artificial desenvolvido internamente que mostra em tempo real como está adesão ao isolamento social. O SIMI-SP (Sistema de Monitoramento Inteligente de São Paulo) é capaz de apontar os locais onde há aglomeração, indicando onde deve ser intensificado o trabalho de informação, o atendimento e o reforço das medidas de higienização.

O ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicações, Marcos Pontes, chegou a conduzir negociações com as operadoras de telefonia para adoção de um sistema federal semelhante, mas desistiu após uma ordem do presidente. Segundo Pontes, ele ainda não acredita na confiabilidade do sistema. A afirmação contradiz a notícia publicada no domingo (5) no site da Agência Brasil, ligada ao governo federal, que garantia que o sistema federal respeitaria o uso de dados segundo a Lei Geral de Proteção de Dados e o Marco Civil da Internet.

“O isolamento social salva vidas e protege as pessoas. Não é agradável nos afastarmos de quem amamos, mas é a recomendação da ciência e da medicina” João Doria, governador de São Paulo (Crédito:Divulgação)

A secretária de Desenvolvimento Econômico de São Paulo, Patrícia Ellen da Silva, que lidera a operação, explica que o sistema cruza os dados de casos confirmados e suspeitos com informações fornecidas pelas secretarias de Saúde, Logística, Defesa Civil e institutos de pesquisas tecnológicas. A partir daí, são feitas projeções baseadas na geolocalização e comparações com as curvas epidemiológicas de outros países. “A intenção é achatar a curva, melhorando o sistema como um todo para reduzir a mortalidade da doença e acelerar a recuperação econômica”, afirma Patrícia. “Com o sistema, podemos monitorar a utilização de leitos e a concentração da população em determinada área.”

Dados anônimos

A suspeita do uso de dados pessoais dos usuários levou o Ministério Público Federal de São Paulo a pedir esclarecimento ao governador João Doria. A secretária explica que não há violação da privacidade, uma vez que o sistema faz o mapeamento em grupos de milhares de habitantes. “Recebemos apenas indicadores com percentuais e os dados são agregados de forma anônima. Analisamos o deslocamento por bairros e municípios, e fazemos uma média geral no Estado. O isolamento está hoje na faixa de 50%, taxa que garante um mínimo de equilíbrio, mas o ideal seria 70%”, afirma. O SIMI-SP cobre mais de 90% de todo o Estado de São Paulo.

Países como Coreia do Sul, Israel e EUA já utilizam sistemas semelhantes. Na China, no entanto, a situação é mais radical: sistemas de reconhecimento facial supervisionam os cidadãos individualmente. O Big Brother paulista ainda está bem longe disso.