Quando você bate a canela, coloca gelo ou faz compressa quente? Essa é uma dúvida bastante comum entre os pacientes, pois são métodos reconhecidos pelos seus benefícios; além de serem super acessíveis, de baixo custo e de fácil aplicação. Mas como tudo na vida, de nada adianta não saber usá-los corretamente. 

“Mas qual o melhor para o meu caso?”. A resposta certa é depende —já que é preciso avaliar fatores como local da dor ou da lesão, tempo de sintoma e sinais clínicos. Então, os pontos principais para seu checklist, estão:

  • Avaliar a causa. Se é uma lesão, queda, esforço excessivo ou algum movimento novo que machucou.
  • Quando e como ela se iniciou. Há quanto tempo sente dor ou se é algo recorrente (crônica). 
  • Observar se além da dor, há sinais de inflamação. Como inchaço, aumento de temperatura local ou mudança de coloração.

Efeitos fisiológicos, benefícios e cuidados da técnica utilizando gelo 

O uso do gelo, também chamado tecnicamente de crioterapia, é uma das técnicas mais antigas utilizadas para redução da dor e inchaço. 

A crioterapia pode ser utilizada de diferentes maneiras através de bolsa térmica, crioimersão (imersão de uma parte do corpo ou até do corpo inteiro em banheira de água com gelo) e criomassagem.

É supercomum vermos celebridades entrando em banheiras de gelo, não é mesmo? Antes restrito ao mundo esportivo de atletas de elite e amplamente utilizado como recovery para reduzir o incômodo pós-treino, hoje ganhou status de “retiro de autoconhecimento” em que coaches têm investido na técnica. Sem entrar nessa área e independentemente se você acredita nesse tipo de uso, trago aqui apenas a parte científica voltando o foco a dois efeitos principais do gelo, que são o de diminuir o fluxo sanguíneo no local onde é aplicado e de reduzir a condução nervosa –quando a informação da dor demora mais tempo para chegar ao cérebro, diminuindo a percepção e intensidade.

Até por isso, na área esportiva, faz muito sentido seu uso como uma estratégia de reduzir microlesões decorrentes da partida, treino ou jogo. Seu principal efeito inclui a alteração do metabolismo local, que restringe o fluxo sanguíneo e, consequentemente, evita que uma lesão primária se torne mais extensa. Isso significa que a inflamação fica mais contida e em uma área mais restrita geralmente quando ocorre uma lesão, há o extravasamento de marcadores e líquidos que podem ampliar a lesão local. Por isso que muitas vezes o que era uma “pancadinha”, se torna uma grande área toda inflamada e dolorida ao redor também.

O gelo então cumpre seu papel sendo super útil em reduzir o inchaço (edema), evitar o hematoma (sangramento interno), reduzir a dor e anestesiar o local. Estudos apontam que a aplicação de crio por 20 minutos reduz cerca de 30% a transmissão dos impulsos nervosos de dor, sendo que esses efeitos podem perdurar por cerca de 30 minutos após a aplicação.

Aplicação de gelo
Arquivo pessoal Dra. Renata Luri

Vale lembrar que a utilização do gelo e bolsas térmicas exige cuidados. O tempo médio de aplicação para se obter bons resultados é de aproximadamente 15 a 20 minutos e pode ser realizado a cada 2 horas. 

E como usar o gelo de forma prática? No mercado há diversos pacotes térmicos que você pode levar durante uma viagem ou até prova. Mas, caso o acidente aconteça em casa, uma dica barata e simples é pegar um saquinho plástico de mercado, colocar o gelo comum dentro e usar um batedor de carne ou martelinho para triturar o gelo. Coloque mais um saco para garantir que a água não escorra quando o gelo derreter. 

Importante! Para não correr o risco de machucar a sua pele, é recomendado utilizar fronha ou toalha fina para se proteger. Caso permaneça em contato direto com a pele ou por tempo prolongado, há sim, o risco de gerar ulcerações, lesões em pele e paralisias de impulsos em trajetos nervosos. 

A fisioterapeuta especializada em ortopedia e sócia da Clínica La Posture, Ana Clara Maldonado Desiderio, pontua algumas situações em que o gelo costuma ser mais indicado que outros recursos, como: lesões agudas como batidas, entorses, pós-operatórios, estiramentos ou lesões musculares (principalmente nas primeiras 48 horas pós-pancada) ou nas famosas famílias de “ites” (tendinites, bursites, sinovites). Os pacientes respondem bem ao gelo e colhem excelentes benefícios quando usam imediatamente após uma lesão. Mas, na prática, vemos que há muita gente sensível ao gelo que pode não se sentir confortável em fazer uso e não há  problemas. Há alternativas não-medicamentosas que podem fazer a vez do gelo para essas pessoas. 

Um cuidado que queremos frisar aqui são com as pessoas com insuficiência circulatória, alergia a gelo ou diabetes avançada, que devem ter muita cautela ou até evitar esse procedimento. Se você tem hipersensibilidade ao frio, lesão ou síndrome vasomotora, não faça uso da crioterapia. Em caso de dúvidas, sempre indicamos que consulte um fisioterapeuta especialista.

O próximo texto é sobre compressa quente. Espero vocês!

*Colaboração da Dra. Ana Clara Desiderio Maldonado, Fisioterapeuta, Membro da Sociedade Brasileira de Fisioterapia Esportiva – SONAFE, Sócia da Fisioterapia na Clínica La Posture. (CREFITO-3/255325-F)

**O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

***Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

Referências Bibliográficas

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