A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, defendeu nesta sexta-feira, 17, a criação de uma “verdadeira” união de mercados de capital (CMU, na sigla em inglês) na Europa. Segundo ela, a estratégia é crucial para lidar com “os desafios no horizonte”, em um quadro global de mudanças, com recuo na globalização, além de mudanças demográficas e a busca pela redução nas emissões de carbono. Em sua fala, ela não tratou de política monetária nem da inflação na zona do euro.

Lagarde discursou no Congresso Bancário Europeu, em Frankfurt, Alemanha. Ela disse que alguns podem argumentar que, a menos que se comece a emitir bônus comuns da União Europeia, o projeto de uma CMU não terá sucesso. “Mas mesmo que isso esteja correto, não deve impedir que trabalhemos em muitas outras áreas necessárias para uma CMU se tornar realidade”, argumentou. “A lição da integração europeia é que temos de adotar os passos que estão à frente de nós, quando o momento surgir, e então os outros eventualmente se seguirão.”

A presidente do BCE acredita que há um “imenso desafio de financiamento à frente” e pediu ações agora para lidar com o quadro. Ela comparou o quadro na Europa ao contexto dos EUA de meados do século XIX, no qual houve necessidade de financiamento em escala sem precedentes, para levar adiante iniciativas como um sistema ferroviário que impulsionou a economia do país. Segundo ela, a Europa agora enfrenta contexto similar, ao emergir de “uma série de choques econômicos profundos”, com a pandemia da covid-19 e seus desdobramentos.

Lagarde considera que uma união dos mercados de capital é “indispensável”, por duas razões. Uma delas é que, a partir de exemplos históricos, está claro que as condições para os mercados de capital se desenvolverem ainda não estão satisfeitas para a Europa, na falta de um projeto unificador. Além disso, ela considera que a região tem dependido muito de “uma abordagem de baixo para cima” na integração.

A presidente do BCE vê “sinais crescentes de que a economia global está se fragmentando em blocos concorrentes”. Citou também a mudança no quadro demográfico, com envelhecimento no continente, e o impacto de desastres climáticos que “estão crescendo a cada ano”, o que gera a necessidade de ações. Lidar com todos esses desafios em simultâneo “exigirá um esforço geracional, e investimento massivo é necessário em um curto espaço de tempo”, argumenta.

Conforme surgem novas barreiras comerciais, é necessário reavaliar cadeias de produção e investir em novas, mais seguras e eficientes e próximas, apontou. Com o envelhecimento, será necessário buscar tecnologias para produzir mais com menos pessoal, disse ainda, citando a digitalização como uma ajuda para isso.

Para dar uma ideia dos volumes envolvidos, Lagarde mencionou que a Comissão Europeia estima que apenas a transição verde exigirá investimento adicional de 620 bilhões de euros ao ano, na média, até 2030, e mais 125 bilhões de euros ao ano para a transição digital.

Lagarde afirmou que o mercado de capitais da Europa segue fragmentado, com a integração financeira menor que antes da crise financeira. Os mercados de bônus são três vezes menor que o dos Estados Unidos, comparou.

Segundo a autoridade, empresas precisam de financiamento para digitalizar e reduzir emissões de carbono. Uma CMU “genuína” significaria construir um mercado de securitização suficientemente grande, permitindo que os bancos transfiram algum risco a investidores, liberem capital e empréstimos adicionais, listou. E também lembrou que mercados de capital pouco desenvolvidos dificultam financiamento de qualidade para empresas que impulsionam a inovação.