E ncerrou-se em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, um capítulo vergonhoso da história recente do Brasil. No último sábado 12, o terrorista de esquerda Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua na Itália pelos assassinatos de quatro pessoas, cometidos na década de 1970, foi preso depois de fugir do Brasil, onde vivia desde 2004, e deportado para Roma. Em 2010, em seu último dia de mandato, o ex-presidente Lula havia concedido asilo a Battisti, coroando, assim, a versão fantasiosa, criada pelo PT, de que o italiano era inocente e sofria “perseguição política” em seu país. Curiosamente, a mesmíssima retórica foi adotada no ano passado para fazer frente à prisão do próprio Lula.

Os estrategistas do PT sempre foram eficientes, principalmente nos tempos em que o partido ocupou o poder, em repetir uma mentira com afinco até ela ser vista como verdade por uma parte da população. A ideia de perseguição política é uma delas. O apoio que Battisti recebeu do PT se explicava, em parte, pela afinidade ideológica com o homem que integrou a organização Proletariados Armados para o Comunismo (PAC). Também se justificava pelo desejo de agradar às alas mais radicais dos partidos esquerdistas da base de Lula. Mas não era só isso. A tese de defesa de uma suposta vítima de perseguição política também servia ao propósito de reforçar o clima de “nós contra eles” que o PT introduziu na política nacional. Movimentos excludentes, que não permitem divergências, de vez em quando precisam encontrar um fato aglutinador, como foi o caso Battisti, para testar a fidelidade de quem orbita em torno do grupo político que ocupa o poder.

O PT foi derrotado, mas o patrulhamento ideológico está de volta, com sinal invertido. Aliados do presidente Jair Bolsonaro prepararam um dossiê sobre funcionários do Poder Executivo que, supostamente, são simpáticos ao PT. O documento tem por objetivo embasar o que o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, chama de “despetização” da máquina pública. Quem estudou a história da União Soviética sabe que qualquer expurgo é usado, também, para resolver disputas pessoais. Esse é um risco. O outro é o de afastar servidores que desempenham de maneira exemplar suas funções e que não colocam suas preferências políticas acima do compromisso profissional. A necessidade de “despetizar” o governo parece ser uma daquelas teses que servem mais ao propósito de manter a tensão “nós contra eles” do que propriamente ao de resolver os problemas nacionais. O PT não faria melhor.

Movimentos excludentes costumam criar fatos aglutinadores para testar a fidelidade de seus partidários