Ao assumir a tarefa de dirigir seu primeiro filme, o ator Murilo Benício se lançou ao trabalho de adaptar para as telas do cinema “O Beijo no Asfalto”, um dos textos mais emblemáticos do escritor Nelson Rodrigues (1912-1980) para o teatro, sem perder algumas das principais características que definem as artes cênicas. O resultado, exibido pela primeira vez na 41ª Mostra de Cinema, chega ao circuito na quinta-feira 6. Filmada em preto e branco, a obra transpõe a história e, ao mesmo tempo, revela o processo criativo envolvido em uma montagem teatral.

Benício decidiu incluir no roteiro a discussão feita entre Amir Haddad, ator e diretor teatral, e o elenco, composto por nomes como Lázaro Ramos, Débora Falabella, Stênio Garcia e Fernanda Montenegro. A atriz participou da primeira versão da peça, em 1961, e agora retorna em outro papel. Sentados ao redor de uma mesa, eles leem o texto original, enquanto Haddad pontua o significado de determinadas falas. Assistindo a essas cenas de bastidores e, depois, ao resultado final, o espectador entende como essa leitura determina o caminho que a obra toma. “Temos quatro horas de material”, disse Benício. “Poderíamos fazer um documentário só com as imagens da leitura, mas resolvi colocar apenas o necessário para não quebrar a narrativa”.

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A natureza da história, que lida com o escândalo que um beijo entre dois homens pode causar e a veracidade das informações divulgadas na imprensa, faz com que o filme pareça ter sido feito há um mês. Não foi. “Infelizmente, tivemos ‘sorte’ em lançar ‘O Beijo no Asfalto’ agora”, afirma Benício. Embora considere impossível não associar a mensagem do longa à situação política,
o diretor se afasta da militância. “Queríamos contar Nelson Rodrigues, um dos maiores dramaturgos do mundo, para toda uma geração que não conhece sua obra”.