Parece arquibancada de estádio: entre uma cerveja e outra, um petisco e outro, torcedores puxam cantos famosos de seus times, batem nas mesas, reclamam da arbitragem, cobram técnicos e jogadores, vão ao delírio com os gols. Grupos de torcedores de, ao menos, dez clubes da Série A do Campeonato Brasileiro de outros Estados se encontram praticamente toda semana em bares paulistanos para assistir aos jogos e experimentar a paixão coletiva, mesmo a centenas de quilômetros dos estádios.

Reduto dos torcedores do Atlético Mineiro em frente ao Parque da Água Branca, o Bar do Parque dá preferência aos jogos do clube desde 2007 – quando um cliente regular do restaurante questionou o dono santista sobre a possibilidade de transmitir as partidas. A adesão dos atleticanos forçou até mudanças no local: “O bar só tinha um telão, então corremos atrás para colocar mais. E mineiro bebe muito. Tivemos de aumentar o estoque de cerveja”, conta o gerente Anderson Matos, 45 anos. Faixas e bandeiras com as cores do Atlético são guardadas no próprio estabelecimento. Em jogos decisivos, como a final da Libertadores de 2013, o bar chegou a receber quase 500 torcedores.

Outro movimento antigo é dos torcedores do Fluminense em São Paulo, a Sampa Flu, que organiza reuniões desde 1999, quando o clube estava na Série C. Atualmente, o ponto de encontro é o boteco Garota da Vila, no bairro Vila Olímpia. Tricolor desde criança, nascido nas Laranjeiras, o proprietário André Silveira, 36 anos, costumava assistir aos jogos com o grupo no Delicacy, perto da Avenida Paulista, até que a torcida precisou migrar de ambiente. “A prioridade (do telão) é sempre do Fluminense. Pode ser final da Copa do Mundo, Brasil fazendo 7 a 1 na Alemanha, que aqui vai passar Fluminense e Bangu pelo Carioca”, brinca o empresário.

Alguns estabelecimentos têm identificação óbvia com as regiões de origem dos clubes. É o caso da hamburgueria Consulado Gaúcho, em Campo Belo, local favorito dos torcedores do Grêmio, e do restaurante Matriz Mineira, ponto de encontro dos adeptos do Cruzeiro, no bairro Itaim Bibi.

O advogado Álvaro Bomfim, 43 anos, um dos responsáveis pelo grupo cruzeirense Sampa Azul, criado em 2009, conta que os encontros costumam ir além do clima de arquibancada nos bares. Em 2014, ele próprio se juntou a dois amigos cruzeirenses para fundar empresa de informática, hoje fora de atividade. “Até casamento já saiu daqui, oportunidade de trabalho… Fora a questão da amizade, a turma da pelada e da balada”, comenta. Já os gremistas têm projeto ambicioso de construir uma “Casa do Grêmio” em São Paulo, com apoio do clube, revela o empresário e membro do consulado José Eduardo Acencio, 31 anos.

Há também grupos que dividem espaços, como os de Flamengo e Internacional no Quintal do Espeto da Avenida Carinás, em Moema. A exceção é quando a partida é entre eles, como na recente quartas de final da Libertadores – os colorados se concentraram no outro ponto de encontro na cidade, o Seu Bezerra, em Vila Madalena, que também recebe torcedores em dia de jogos. O Consulado do Inter ganhou força a partir de 2006, época de ouro com a conquista da Libertadores e o Mundial de Clubes, aponta o cônsul Ari Dias, 55 anos, redator publicitário.

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Embaixador do Flamengo em São Paulo, o empresário Rodrigo Fortuna, 46 anos, diz que a presença dos torcedores praticamente dobrou a partir de agosto, com o time na liderança do Campeonato Brasileiro, para cerca de 300 pessoas. O grupo existe desde 2004, quando os encontros eram marcados em grupos de bate-papo da rede social Orkut. Nesse meio tempo, Fortuna chegou a adquirir parte de um bar em Vila Mariana para manter a transmissão dos jogos do rubro-negro. De lá, partiram para a Avenida Paulista para comemorar a conquista do Brasileirão de 2009, o mais recente. Nesta quarta-feira, a meta é reunir três mil torcedores para assistir ao jogo com o Grêmio pela semifinal da Libertadores em três bares espalhados pela cidade.

Oficializado pelo Ceará em agosto, o Consulado Alvinegro marca os encontros no bar Salvador, no bairro Moema, com lista de presença pelo aplicativo WhatsApp. É a melhor forma de garantir a torcida pelo clube na capital paulista. “Não são todos os bares que transmitem jogos (de clubes) de fora de São Paulo”, justifica o analista de departamento pessoal, Felipe Rafael Barbosa, 28 anos.

O dono do Salvador, porém, torce para o Botafogo, o que ajudou a firmar o lugar também como reduto dos torcedores do time carioca após a Copa América. Criado em 2016, o grupo Sampa Fogo se reúne “religiosamente” todas as rodadas, incluindo torcedores da Grande São Paulo, destaca o jornalista e representante da comunidade Carlos Dias, 35 anos. Antes, a peregrinação era na Mooca.

Outra embaixada de clubes do Nordeste presente em São Paulo é a do Bahia. Depois de anos de torcida em restaurante de comida baiana no bairro Santa Cecília, o ponto de encontro mudou para o bar Porto Madalena, em Vila Madalena, em parceria com o dono corintiano. A Bahêa Sampa existe desde 2011. O presidente é o administrador de empresas Paulo Adriano Moreira, 41 anos.

Fato é que o último grito de campeão na cidade veio da avenida Indianápolis, perto do Ibirapuera. Dezenas de torcedores do Athletico Paranaense acompanharam a conquista da Copa do Brasil 2019 no Jura Snooker Bar, bar que dá preferência às partidas do time. Segundo o publicitário Christiano Magari, 43 anos, a embaixada CAP organiza os compromissos desde 2015.


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