O mar não está para peixe para o presidente Jair Bolsonaro (PL). Pesquisas recentes mostram que seu principal adversário na disputa pela presidência da República, o ex-presidente Lula, pode estar próximo da chance de vitória no primeiro turno. Para piorar o cenário, mais de metade dos eleitores brasileiros dizem não confiar naquilo que o presidente diz. Mas onde alguns veem crise, o Centrão, com seu inigualável senso de conveniência, vê oportunidade. O grupo por ora segue no barco do capitão, e até mesmo se dispõe a ajudar na navegação. Desde que por um preço ainda mais alto em benesses, claro. Quando cantarolou “se gritar pega ladrão, não fica um, meu irmão”, em referência aos parlamentares do bloco, o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, certamente não imaginava que não só o governo de Jair Bolsonaro, mas também sua chance de reeleição, dependeriam agora quase que exclusivamente do empenho dos valorosos integrantes do Centrão.

Comissões

O Progressistas, de Ciro Nogueira e Arthur Lira, e o PL de Valdemar Costa Neto já estão a postos: prometem incrementar a campanha de Bolsonaro garantindo a ele empenho na busca por votos e palanques regionais.

Para garantir ainda mais cargos e verbas na administração pública federal, parlamentares do bloco vão comandar, na Comissão Mista de Orçamento (CMI) do Congresso, alguns dos setores mais sensíveis para o País na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2023, enviada pelo governo no final de abril, ocupando as principais relatorias das comissões. Por meio da LOA, o Executivo indica suas prioridades para o ano subsequente, disciplina o equilíbrio entre as receitas e despesas e estabelece regras e limites para os gastos de cada um dos Poderes. São 16 relatorias setoriais, e os nomes dos responsáveis foram confirmados na quarta-feira, levando em conta o tamanho das bancadas e depois de intensas articulações entre os líderes partidários.

O Progressistas de Arthur Lira e Ciro Nogueira, por exemplo, conseguiu abocanhar a relatoria setorial da área da Educação, que no ano passado estava com o MDB. O responsável será o deputado Aj Albuquerque, do PP do Ceará. Ministro da Casa Civil de Bolsonaro, Ciro Nogueira tem demonstrado bastante afinidade com o tema. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) é comandado por um apadrinhado, Marcelo Ponte, que foi seu chefe de gabinete. Quando assumiu o ministério, Ciro prometeu a prefeitos aliados a ele do Piauí que, mesmo afastado do mandato no Senado, se faria ainda mais presente no seu estado natal com seu trabalho e suas ações. Recentemente, o FNDE destinou R$ 4,1 milhões a 17 prefeituras do Nordeste para a aquisição de caminhões frigoríficos destinados ao transporte de merenda escolar. Do total de municípios contemplados, 14 são comandados por prefeitos do PP de Ciro. É um caso exemplar do fisiologismo do Centrão.

Também ficará com uma aliada do ministro-chefe da Casa Civil a relatoria temática de Mulheres, Família e Direitos Humanos. A indicada para o posto, aliás, não poderia ser mais família: a senadora Eliane Nogueira é mãe do poderoso Ciro, que na campanha de 2018 prometeu ficar com Lula “até o fim”. Ela assumiu o mandato no Senado em 2021, quando o filho se licenciou para integrar o governo Bolsonaro.

No Orçamento para o próximo ano, o Progressistas de Ciro Nogueira abocanhou a relatoria da Educação, que tem sob sua batuta o FNDE,setor que mais movimenta verbas suspeitas do orçamento secreto

Por sua vez, o PL de Valdemar Costa Neto vai ficar responsável pela relatoria setorial da área da Agricultura. O indicado para a tarefa é o deputado federal paraibano João Maia. Costa Neto é uma espécie de CEO vitalício do Centrão – entra governo, sai governo, tem conduzido o bloco sempre ficando com quem paga mais. Em 2005, quando estourou o escândalo do Mensalão, ainda durante o primeiro mandato de Lula, ele já estava no posto. Renunciou ao mandato de deputado federal após ser condenado à prisão por envolvimento no esquema. Embora nas sombras desde então, segue mais atuante do que nunca: como um assessor informal de Bolsonaro, tem acompanhado o presidente em encontros com apoiadores especialmente quando o tema é arrecadação de dinheiro para a campanha.

É desse tipo de gente que tem se cercado o presidente, e a um custo cada vez mais elevado para o País. Diante da ameaça de um emborcamento na candidatura de Bolsonaro, se prontificam a endireitar a embarcação. Mas quando o navio começa a afundar de verdade, são os primeiros a abandonar o barco, prontos para embarcar no próximo.