Um auditoria interna na ginástica artística do Esporte Clube Pinheiros detectou problemas no tratamento dos atletas em denúncia feita por alguns dos esportistas. O documento do ano passado serviu de base para mudanças estruturais na modalidade, como a instalação de câmeras no ginásio onde os atletas treinam. Procurado pelo Estadão, o clube informou que “realiza auditoria interna em todos os departamentos de forma periódica para avaliar a aderência às políticas e procedimentos”.

Parte do relatório foi divulgada em reportagem da TV Globo no domingo. O documento citado apresentava insatisfações de atletas e acusações de assédio moral e até injúria racial. “Todas as auditorias são conduzidas pelo departamento de Governança e Compliance do Esporte Clube Pinheiros, sendo adotadas, quando necessário, ações corretivas nos procedimentos que estão em desconformidade com os processos e políticas interna”, explicou o clube. “Cumpre esclarecer que os resultados obtidos das referidas auditorias são confidenciais e de competência exclusiva do Esporte Clube Pinheiros.”

Arnaldo Queiroz Pereira foi diretor de Esportes Olímpicos e Formação do Pinheiros entre 2003 e 2007 e depois de 2015 a 2019. Ele conta que a auditoria na ginástica artística começou por um motivo diferente do que ocorreu e que o primeiro relatório apontou exageros. “Tomei ciência desse relatório em junho de 2019. Conversando internamente, a gente notou que tinham carregado um pouco na tinta. Os treinadores atendem dezenas de famílias e eles têm uma aprovação impressionante”, explica.

Ele conta que não viu a versão final do relatório de governança, pois já não ocupa mais a função no clube. Mas lembra que algumas medidas foram tomadas na época, até para tornar o ambiente mais saudável. “Algumas ações pudemos fazer, pois os treinadores precisam de ajuda para calibrar alguma coisa. Não acho que o grito configura assédio moral. Mas houve ação corretiva e decidimos colocar as câmeras e conversar com os treinadores para dar apoio para requalificação. Íamos tentar mexer um pouco nas idades de entrada das crianças. A ideia era que em 2020 a idade seria um pouco maior para admissão”, diz.

Arnaldo pondera que os gritos são normais e aceitáveis. “Os exercícios são difíceis e os gritos são para acerto, são comemorados. Confio muito na qualificação dos treinadores e no trabalho que eles fizeram. São cerca de 300 famílias que frequentam os treinamentos, incluindo a escolinha. Não houve nada de errado ali”, garante, lembrando que os treinos são abertos e qualquer um que está no clube pode entrar lá e assistir.

Nas redes sociais, diversos depoimentos corroboraram com o comentário do ex-diretor do clube e atualmente conselheiro. Marcus Vinicius Silva postou que acompanha os treinos mais de perto por causa de sua filha e que “nunca presenciei nenhum tipo de discriminação de cor ou qualquer outro tipo lá dentro”.

O ginasta Angelo Assumpção, que é negro, foi atleta do Pinheiros até o final do ano passado. O clube optou por não renovar o contrato e ele insinua que houve racismo nessa decisão. Em 2015, um vídeo mostrou que alguns ginastas o tratavam com discriminação na época, como Arthur Nory, que reconheceu o erro que cometeu. “Não foi uma brincadeira. Foi uma atitude repugnante inaceitável que hoje não pode acontecer mais. A gente não pode ser conivente com uma situação como essa”, disse para a TV Globo.

O Pinheiros rechaça que a não renovação de contrato de Angelo Assumpção tenha outro motivo que não seja técnico. “Ele foi atleta do clube por mais de 10 anos e após uma avaliação técnica, financeira e comportamental do colegiado esportivo responsável pelas renovações contratuais, decidiu-se não renovar o vínculo. O Esporte Clube Pinheiros reforça que repudia qualquer ato discriminatório ou preconceituoso, possuindo políticas internas, regulamentos, canal de denúncias e normativos que reforçam a conscientização de toda a sua comunidade e o compromisso do clube com a ética e a integridade.”

Nos últimos tempos, a ginástica artística tem sido uma das modalidades mais vitoriosas no Pinheiros, junto com as tradicionais judô e natação. Nory foi bronze olímpico nos Jogos do Rio e campeão mundial no ano passado. Nos Jogos Pan-Americanos de Lima, ele e Chico Barretto brilharam. “Reiteramos que os atletas e técnicos vêm recebendo todo suporte psíquico e físico com a equipe médica do Pinheiros neste último ano, para que a gestão dos técnicos e convívio entre os atletas seja satisfatório e benéfico a todos”, conclui o Pinheiros, que é o principal clube formador de atletas olímpicos do País.